[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

domingo, 29 de dezembro de 2013

[0422.] MARIA LAMAS [I]



* MARIA DA CONCEIÇÃO VASSALO E SILVA DA CUNHA LAMAS *
[06/10/1893-06/12/1983]


Jornalista e escritora reconhecida, Maria Lamas conciliou a vida profissional com uma incansável batalha de décadas em prol dos direitos das mulheres portuguesas e dos cidadãos do seu país.

Empenhada, persistente e combativa, nomeadamente nos tempos adversos da ditadura salazarista, nunca abdicou da denúncia das injustiças e tornou-se num dos principais símbolos da oposição ao Estado Novo. 

Filha mais velha de Maria da Encarnação Vassalo e de Manuel Caetano da Silva, nasceu, em 6 de Outubro de 1893, em Torres Novas, e faleceu na capital a 6 de Dezembro de 1983, exactamente dois meses após ter completado 90 anos de idade. 

Estudou no Colégio das Teresianas de Jesus, Maria e José e em Março de 1911, somente com dezassete anos, casou com o republicano Teófilo José Ribeiro da Fonseca, Tenente da Cavalaria, responsável pela sua iniciação política. 

Depois de anos difíceis, devido à vida militar do marido, com passagem por Angola e por França, durante a I Guerra, divorciou-se em 1919, ficando com as filhas Maria Emília (1911) e Manuela (1913-1960) a cargo. Tinha então 25 anos. 

Em Abril de 1921 torna a casar, desta vez com o jornalista monárquico Alfredo da Cunha Lamas, e em Maio do ano seguinte nasceu Maria Cândida, sua terceira filha. Entretanto começara a trabalhar na Agência Americana de Notícias, dirigida pela jornalista Virgínia Quaresma e, a pouco e pouco, afirma-se na imprensa ao dirigir e colaborar em diversos suplementos infantis. 

Em 1930, um ano após ter entrado, por intermédio de Ferreira de Castro, para O Século e começado a dirigir Modas e Bordados, foi a responsável pelo evento “Mulheres Portuguesas - Exposição da Obra Feminina, antiga e moderna de carácter literário, artístico e científico”, tratando-se de um acontecimento cultural relevante pela diversidade do acervo artístico, literário e científico exposto, desde o Renascimento até aquela data, por envolver mulheres de todas as profissões e das diferentes regiões do país, misturando artesãs e intelectuais, e pela afluência do público. 

Em 7 de Fevereiro de 1934 foi, pela primeira vez, condecorada pelo Estado ao ser agraciada com o grau de Oficial da Ordem de Santiago da Espada. 

A partir da segunda metade da década de 30, evidenciou-se como activista da Associação Feminina Portuguesa para a Paz e, principalmente, do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, onde desempenhou diversos cargos. 

Fez parte da Comissão que, em 10 de Fevereiro de 1940, entregou à Assembleia Nacional um requerimento pedindo que as competências da Tutoria da Infância sobre as raparigas fosse alargada dos 16 para os 21 anos, de forma a impedir o registo de toleradas antes desta idade, como estava sucedendo, e assinou, entre 1940 e 1945, textos na revista Alma Feminina, utilizando o nome de Armia. 

Foi eleita Presidente das Secções de Educação (1937) e de Literatura (1939) e integrou as Comissões de Literatura (1940-1941; 1943) e Arte (1943-1944), até assumir, em Julho de 1945, a presidência da Direcção. Nesta qualidade, promoveu campanhas de alfabetização – já em 1922 se tinha interessado pela instrução das operárias da Fábrica Simões, em Benfica - e lutou pelos direitos das mulheres mais desfavorecidas. 

Era a sua presidente quando, em 1947, o CNMP foi proibido pelas autoridades da ditadura, na sequência da organização, na Sociedade Nacional de Belas-Artes, da exposição “Livros escritos por mulheres”. Forçada, por João Pereira da Rosa, a optar entre continuar na direcção da revista Modas e Bordados e o Conselho, não hesitou e manteve-se fiel a este último, ficando desempregada.

Dá então início ao empreendimento da importante obra Mulheres do Meu País

Continuou a desenvolver intensa actividade em prol do pacifismo e integrou, nos anos 50, o Conselho Mundial da Paz. 

As actividades na luta pela paz, com funções relevantes no Conselho Mundial da Paz, a sua projecção internacional e o combate político à Ditadura do Estado Novo, assinando as listas para a fundação do MUD (1945), manifestando o apoio à candidatura de Norton de Matos (1949) e integrando a Comissão Central do Movimento Nacional Democrático (1949), originaram sucessivas perseguições e prisões (1949, 1950-1951, 1953). 

Exilou-se em Paris entre 1962 e 1969, onde se tornou uma figura ímpar no apoio aos portugueses, emigrantes e políticos, que saíam do país. O Grand Hotel Saint-Michel, na Rua Cujas, 19, tornou-se local de passagem obrigatório para intelectuais e oposicionistas: são muitos os testemunhos sentidos e comoventes desses anos de convívio e, sobretudo, de solidariedade. 

Fiel aos ideais, viveu intensamente os acontecimentos subsequentes à Revolução de Abril de 1974. Foi dirigente do Comité Português para a Paz e Cooperação, directora honorária da revista Modas e Bordados (1974), presidente de honra do Movimento Democrático das Mulheres (1975) e, até à sua morte, directora da publicação Mulheres (1978), tendo-se ainda filiado no Partido Comunista Português. 

Entre as várias condecorações que recebeu, conta-se a da Ordem da Liberdade, com que foi agraciada pelo Presidente Ramalho Eanes, em 1982. 

Merecedora de frequentes evocações e homenagens, antes e depois de 1974, a riqueza e a diversidade do percurso de Maria Lamas pode ser esmiuçada através do seu espólio, que integra o Arquivo de Cultura Portuguesa da Biblioteca Nacional [Esp. E 28]. 

[João Esteves]

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