[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

[1067.] 40 VIDAS POR ABRIL [II]

* RESISTÊNCIA NO FEMININO *

[Porto, Modo de Ler, 2015]

A investigação, embora morosa, torna-se fascinante e resulta do permanente cruzamento de informações, da atualização de dados, mesmo quando parecem quase irrelevantes, e da reconstrução de pequenos puzzles.

Há três organizações de mulheres que, para além das lutas pelos direitos das mulheres, devem também ser enquadradas, pelo número e nome das militantes envolvidas, nas lutas oposicionistas contra a Ditadura: o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas [1914-1947], a Associação Feminina Portuguesa para a Paz [1935-1952] e o Movimento Democrático de Mulheres [1969-1974], esta última ainda em atividade.

A Associação Feminina Portuguesa para a Paz, quer em Lisboa, em Coimbra ou no Porto, englobou oposicionistas que, pela sua intervenção, umas vezes visível, outras quase na sombra, deviam merecer atenção privilegiada quando se pretende estudar globalmente o difícil combate a 48 anos de continuada Ditadura.

A importância da AFPP, e da  Delegação do Porto já parcialmente estudada por Lúcia Serralheiro em Mulheres em Grupo Contra a Corrente [Edições Evolua, 2011], acaba por estar subjacente nalgumas destas 40 vidas apresentadas nesta edição simultaneamente simples, cuidada e apelativa.

Senão, vejamos, esperando que os dados estejam corretos:

- O terceiro testemunho é de Almor Viegas, economista. Ora a sua esposa [n. 1927], Maria Amélia Viegas, com quem casou em 1947, aderiu em 1949 à Delegação do Porto da AFPP, sendo a sócia nº 429. Era então uma jovem com 22 anos, não tendo tido papel relevante nas suas atividades, embora fosse a reuniões e participasse nalgumas iniciativas, como referiu na entrevista realizada no Porto por Lúcia Serralheiro em 29 de Março de 2001. Não pertencia ao Partido Comunista, apesar do marido ser militante. 

- O vigésimo primeiro testemunho envolve João Huet Viana Jorge, engenheiro. A mãe, Maria Luísa Huet de Bacelar Carrelhas [02/05/1912 - 08/04/1997], casou em 21 de Julho de 1937  com Joaquim Guerreiro Viana Jorge [1906-1985]; aderiu ao Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas em 1940, por proposta de Maria da Luz Albuquerque, e presidiu ao núcleo de Vila da Feira, sua terra natal. Irmã de Ema Carrelhas Huet de Bacelar, sócia da Delegação do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz.

- O trigésimo primeiro texto é dedicado a Maria Alda Nogueira [1923-1998], ativista que integrou em Lisboa a AFPP e o CNMP quando este era dirigido por Maria Lamas.

- Maria José Ribeiro, o testemunho 34, refere que foi no Porto que se iniciou na sua luta política e evoca, entre outros, os nomes de Maria Teresa Machado Teixeira Ruela [sócia nº 296], de Virgínia Faria de Moura [1915-1998] e de Olívia Vasconcelos [sócia nº 313], todas filiadas na Delegação do Porto da AFPP.

- O número 36 corresponde a Maria Teresa Guimarães de Medina, professora de Ciências da Educação. Neste caso, trata-se de um dos seis filhos da médica Natércia Freitas Guimarães da Silva [Medina] [1914-1963], professora efetiva de Biologia no Liceu Carolina Michaëlis, onde era muito prestigiada e elogiada pelas alunas. Faleceu em 31 de Janeiro de 1963, com apenas 49 anos de idade; era, segundo manuscrito de Irene Castro, a sócia nº 193 da Delegação do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz; e deu às sócias um curso de puericultura que foi também de educação sexual. É referenciada por Dr.ª Natércia Guimarães no Caderno de Irene Castro. 

Provavelmente, são pormenores. Mas ajudam a quebrar silêncios, a redescobrir ativistas em tempos difíceis e sombrios, a contextualizar percursos de vida e a valorizar o papel de Homens e de Mulheres na luta contra a Ditadura.

Claro que todos os 40 textos merecem a mesma atenção, mesmo que sob outros olhares, sendo que doze envolvem mulheres.

[João Esteves]

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