[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

domingo, 25 de novembro de 2018

[1926.] FRANCISCO HORTA CATARINO [I] || ORGANIZAÇÃO REVOLUCIONÁRIA DE SARGENTOS

* FRANCISCO HORTA CATARINO *
[10/01/1907 - 04/12/1989]

Assumidamente reviralhista, antifascista e anticomunista, Francisco Horta Catarino interveio no combate à Ditadura Militar e à ditadura do Estado Novo desde 1927 até 1974. 

Preso na Fortaleza de São Julião da Barra, no Aljube, em Peniche - de onde se evadiu em 18 de Maio de 1935 e 1 de Maio de 1936 - na Penitenciária de Lisboa, onde cumpriu uma pena de 23 anos, e em Caxias, foi ainda deportado para a Fortaleza de São João Baptista, em Angra do Heroísmo. Exilou-se no Brasil em meados da década de 1960 [1965-1974], depois de ter passado temporariamente por França [1964].

Concluiu, em Setembro de 1977, o livro memorialista Falando do Reviralho com Prefácio de Carlos Vilhena, outro opositor às duas ditaduras, inúmeras vezes preso pela polícia política.

[Francisco Horta Catarino || 1935 || RGP/1363]

Filho de Quitéria Horta Catarino e de Joaquim Francisco da Silva Catarino, Francisco Horta Catarino nasceu na Freguesia do Carvalhal, Bombarral, em 10 de Janeiro de 1907 e faleceu em 4 de Dezembro de 1989, no Porto, com 82 anos de idade. 

Empregado do comércio na Casa Africana do Porto, participou, aos 20 anos, enquanto civil, na revolta contra a Ditadura Militar de 3 de Fevereiro de 1927.

"Por falta de recursos" [p. 16], não se apresentou à Junta de Inspecção do distrito de Recrutamento das Caldas da Rainha e, "também devido a encargos familiares" [p. 16], só em Novembro de 1928 se apresentou no Quartel de Infantaria 18, no Porto, para prestar Serviço Militar, sendo já considerado refractário.

Incorporado num contingente de recrutas de infantaria destinado a prestar serviço na Aviação, integrou o grupo Esquadrilhas de Aviação "República" aquartelado na Amadora.  

Era furriel daquela Esquadrilha quando, em 27 de Janeiro de 1932, se deu a sua primeira prisão, acusado de, erroneamente, pertencer a uma célula comunista, já que o nome constava de uma lista de elementos que o, então, sargento-cadete Armando Ducla Soares "tencionava aliciar para uma organização comunista de que estava encarregado" [p. 132] [p. 25-26].

Segundo o próprio, permaneceu 87 dias na Esquadra de Alcântara em regime de incomunicabilidade; seguiu para a prisão militar instalada na Fortaleza de S. Julião da Barra; e, na sequência de duas exposições ao Ministro da Guerra, coronel Lopes Mateus, em que esclarecia os equívocos da sua detenção, já que não integrava células militares comunistas, foi transferido para o Quartel de Caçadores Nº 5. 

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || p. 25]

Libertado, integrou o Batalhão de Aerosteiros, sediado em Alverca, passou pela Escola de Quadros do Regimento de Infantaria Nº 18, no Porto, sendo promovido a 2.º Sargento, e regressou a Alverca com a família. No Porto, reencontrou a mulher e filhos que não via há quatro anos, tendo, então, casado com Beatriz de Moura e legitimado os filhos [p. 32].

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || p. 32]

Em Alverca, manteve contactos e conspirou com as "forças republicanas que lutavam pelo Reviralho, ou seja, pela Restauração da República Democrática Portuguesa" [p. 32], actividades que originaram a sua prisão em 1933. Preso no Quartel da Cova da Moura, passou para o Presídio de Santarém e seguiu para Peniche onde, em 19 de Novembro, embarcou para Angra do Heroísmo juntamente com mais 150 deportados.

Durante a permanência nos Açores, envolveu-se na criação e direcção da Organização Revolucionária de Sargentos, presidida pelo 1.º Sargento José Maria Videira.  

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || p. 43]

Em meados de 1934, regressou ao Continente, juntamente com João Lopes Soares e apresentou-se no Ministério da Guerra, onde lhe foi entregue uma Guia de Marcha para Peniche, ficando aí com residência fixa e afastado do Serviço. A família acompanhou-o para Peniche, "passando lá a viver precariamente, com os reduzidos vencimentos que ainda me eram concedidos e o rendimento do trabalho de minha esposa, como costureira" [p. 41].  

Como Secretário-Geral da ORS, manteve intensa actividade, deslocando-se, clandestinamente, a vários pontos do país e, em 18 de Maio de 1935, teve de fugir para não ser preso. Considerado desertor em 2 de Junho, acabou por ser detido em 6 de Julho, no Jardim da Estrela, estando na posse de uma pistola F.N. 6.35.

[Francisco Horta Catarino || 1935 || RGP/1363]

Na sequência desta terceira detenção, declarou estar envolvido na ORS com António da Cruz Cristina, Ivo Barreto, José Maria Videira, Otelo Manuel Rodrigues, Peres de Carvalho, Raúl da Encarnação Garcia e Trajano Ambrósio da Silva, entre muitos outros, tendo, ainda, estabelecido contactos com a Organização Revolucionária da Armada (ORA) e responsáveis do Partido Comunista. 

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || p. 55]

Depois de sujeito "a 3 meses de interrogatório, acareações e violências de todo os tipos, na mais rigorosa incomunicabilidade" [p. 53], Francisco Horta Catarino foi levado para a Prisão Militar da Fortaleza de S. Julião da Barra. Demitido da Aeronáutica ao abrigo do Decreto 25.317 de Maio de 1935, seguiu para o Aljube em 26 de Setembro e, em 8 de Outubro, para Peniche onde, em 1 de Maio de 1936, fugiu com o ex-sargento José dos Santos Rocha, que participara no movimento de 26 de Agosto de 1931, e com o ex-tenente Filipe Piçarra, interveniente na Revolução de 5 de Outubro. A fuga de Peniche contou com a colaboração de vários presos, tendo os três envolvidos descido por uma corda a muralha até ao mar, onde um barquito os esperava. 

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || p. 61]

Julgado à revelia pelo Tribunal Militar Especial de 30 de Maio de 1936, foi condenado a "6 anos de desterro, a cumprir no Tarrafal, na multa de mil escudos e na perda dos direitos políticos por dez anos" [Processo 183/935, do TME].

Escondido na zona da Lourinhã, participou, em 1 de Agosto, na tentativa de assalto à sua Repartição de Finanças, da qual resultou a morte de um funcionário provocada, segundo Horta Catarino, por disparos de José dos Santos Rocha para o libertar. Este haveria de conseguir fugir para Espanha e, chegado a Madrid, alistar-se no 5.º Regimento das Milícias.

Manteve-se na clandestinidade, continuou a conspirar e envolveu-se, em Maio de 1938, na revolta militar de Coimbra chefiada pelo Coronel Joaquim Ramos.

Novamente julgado à revelia pelo Tribunal Militar Especial em 7 de Maio de 1938, foi-lhe aplicada a pena de 15 anos de degredo. Seria preso em 20 de Junho, na Feliteira, concelho de Torres Vedras, quando estava escondido numa adega do amigo Carlos Manata Carrasqueiro, tendo sido o agente Rosa Casaco quem comandou a operação [p. 78].

[Francisco Horta Catarino || 1938 || Contracapa de Falando do Reviralho]

Transferido para o Aljube em 25 de Agosto e julgado pelo 2.º Tribunal Militar Especial em 9 de Dezembro desse ano, Joaquim Horta Catarino foi condenado a dez anos de prisão, seguidos de 20 anos de deportação com prisão de dois anos ou, em alternativa, 31 anos de degredo. 

Passou, em 9 de Fevereiro de 1939, para a Penitenciária de Lisboa, a fim de cumprir a pena. Aí permaneceu recluso 23 anos consecutivos, sendo libertado em meados de 1961.

Em liberdade, descobriu que o seu filho Jorge Mateus de Moura Catarino, nascido em 15 de Janeiro de 1927, estava preso desde 19 de Janeiro de 1959 por militância no Partido Comunista e envolvimento na campanha presidencial de Humberto Delgado, tendo por advogado Mário Soares.

[Jorge Mateus de Moura Catarino || 19/01/1959 || RGP/23505]

Francisco Horta Catarino reatou as suas ligações reviralhistas e estabeleceu contactos com o General Humberto Delgado. Novamente preso em 4 de Dezembro de 1963, seguiu para o Aljube e, posteriormente, foi transferido para Caxias, onde saiu em liberdade em 15 de Maio de 1964.

[Francisco Horta Catarino || 04/12/1963 || RGP/1363 || PT-TT-PIDE-E-010-7-1363_P1_m0331]

[Francisco Horta Catarino || 04/12/1963 || RGP/1363 || PT-TT-PIDE-E-010-7-1363_P1_m0331]

Refugiou-se, então, em França e, em 22 de Dezembro de 1964, desembarcou no Rio de Janeiro, onde colaborou com sectores da oposição portuguesa, conheceu com Henrique Galvão e Hermínio da Palma Inácio e escreveu nos periódicos Oposição Portuguesa e Semana Portuguesa. Inicialmente, os seus escritos tinham a assinatura NN 342, correspondendo ao seu número de recluso na Penitenciária de Lisboa. 

Estava no Brasil quando se deu o 25 de Abril de 1974, solicitando, de imediato, a reintegração nas Forças Armadas, a qual se concretizou em 15 de Março de 1976 no posto de sargento-ajudante de Infantaria na situação de reserva. Atingidos os 70 anos em 10 de Janeiro de 1977, foi reformado.

[Francisco Horta Catarino || Falando do Reviralho || Ed. do Autor || 1978]

Neste mesmo ano, em Setembro, concluiu o seu livro Falando do Reviralho, o qual saiu em 1978.

Faleceu no Porto em 4 de Dezembro de 1989.

FONTES:
ANTT, Cadastro Político 3522 [Francisco Horta Catarino / PT-TT-PIDE-E-001-CX09_m0421, m0421a, m0421b, m0421c, m0421d, m0421e].
ANTT, Registo Geral de Presos / 1363 [Francisco Horta Catarino].
ANTT, Fotografia 2904 [Francisco Horta Catarino / ca-PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-4-NT-8904_m0036].
Comissão do Livro Negro Sobre o Regime Fascista / Presidência do Conselho Ministros, Presos Políticos no Regime Fascista II (1936-1939), 1982.
Comissão do Livro Negro Sobre o Regime Fascista / Presidência do Conselho Ministros, Presos Políticos no Regime Fascista VI (1952-1960), 1988.
Francisco Horta Catarino, Falando do Reviralho, Edição do Autor, [1978].

[João Esteves]
[Revisto em 18/12/2018]

1 comentário:

Augusto Salgado disse...

Boa noiote, os meus parabéns pelo seu texto sobre esse meu tio-avô (era irmão da minha avó paterna). Estava a escrever-lhe pois a tradição que me chegou foi que após a fuga de Peniche ele teria estado escondido na adega do João "Policia" no Carvalhal de Óbidos, onde tinha nascido. Efectivamente a adega desse senhor era colada à propriedade dos meus bisavós, tendo na altura uma serventia através da propriedade.
Mas posso estar errado, mas é a "estória" da família.
cmpts
Augusto Salgado