[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

terça-feira, 19 de março de 2019

[2079.] ALEXANDRE VIEIRA [I] || O CASO DA BIBLIOTECA NACIONAL - MARÇO DE 1927

* ALEXANDRE FERNANDES VIEIRA *
[11/09/1880 - 26/12/1973]

[Alexandre Vieira || 04/03/1927 || ca-PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-1-NT-8902_m0042 || "Imagem cedida pelo ANTT"]

Operário gráfico / tipógrafo e jornalista, Alexandre Vieira destacou-se enquanto figura relevante do movimento operário e do sindicalismo revolucionário nos últimos anos da Monarquia e durante toda a 1.ª República, tendo sido o primeiro director do periódico A Batalha, esbatendo-se a sua intervenção sindical e política a partir da década de 1930.

Filho do ferroviário José Fernandes Vieira, nasceu no Porto, na freguesia de Santo Ildefonso, em 11 de Setembro de 1880, com apenas dez anos era aprendiz de latoeiro em Viana do Castelo e aos quinze iniciou, em Coimbra, a sua vida de tipógrafo, profissão a que ficou sempre associado. 

Dirigiu, em Viana do Castelo, O Lutador, órgão local da Federação das Associações Operárias e filiou-se na Associação dos Compositores Tipográficos quando se fixou em Lisboa.

Conviveu com Adolfo Lima [28/05/1874 - 27/11/1943], António Tomás Pinto Quartin [15/01/1887 - 07/02/1970], Aurélio Pereira da Silva Quintanilha [24/04/1892 - 27/06/1987], Emílio Martins Costa [21/02/1877 - 17/02/1952], João Evangelista Campos Lima [1877 - 1956] e Neno Vasco [09/05/1878 - 15/09/1920], quase todos da sua geração, e tornou-se activista do sindicalismo revolucionário. 

Em 1908, durante escassos seis meses, dirigiu o diário A Greve, em colaboração com o anarquista Pinto Quartin e o socialista Fernandes Alves, periódico substituído, em Novembro de 1910, pelo semanário O Sindicalista.

Alexandre Vieira esteve activo durante os dezasseis anos da 1.ª República: participou no Congresso Operário de 1911 e no Congresso Nacional Operário de Tomar, realizado em Março de 1914, assembleia onde se deliberou a criação da União Operária Nacional e seria eleito secretário-geral da Comissão Executiva; integrou, em 1916/1917, a  Comissão de Sindicalistas que diligenciou junto de Afonso Costa devido à galopante carestia de vida; foi o primeiro director do jornal A Batalha, cujo primeiro número saiu em 23 de Fevereiro de 1919; e interveio como delegado ao II Congresso Operário Nacional, realizado em Setembro de 1919, em Coimbra, reunião que criou a Confederação Geral do Trabalho (CGT) em substituição da União Operária Nacional.

Preso por oito vezes, sem nunca ir a julgamento, passou pelas prisões do Limoeiro e do Governo Civil, tendo também permanecido detido no Forte de Elvas, Alexandre Vieira manteve um trajecto muito peculiar no movimento sindical, não procurando rupturas com os diferentes intervenientes da época e convivendo com alguns dos principais intelectuais republicanos e socialistas.

Chefiou a tipografia da Seara Nova e, depois, a da Biblioteca Nacional quando Jaime Cortesão [29/04/1884 - 14/08/1960] e Raul Proença [10/05/1884 - 20/05/1941] assumiram a sua direcção. Foi aqui que, já depois de instituída a Ditadura Militar e demitidos aqueles, Alexandre Vieira seria preso pela nona vez, na sequência de um conflito laboral com Fidelino de Figueiredo [20/07/1888 - 20/03/1967], o novo director da instituição nomeado em 16 de Fevereiro. 

[Alexandre Vieira || 04/03/1927 || ca-PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-1-NT-8902_m0042 || "Imagem cedida pelo ANTT"]

Em defesa dos direitos laborais que o novo Director resolveu retirar aos gráficos, Alexandre Vieira e mais doze operários foram recebidos por Fidelino de Figueiredo no seu gabinete, em 3 de Março de 1927. Perante a ordem de expulsão de Alexandre Vieira do edifício e a agressividade crescente de Fidelino Figueiredo, aquele, sentindo-se ameaçado fisicamente, deu-lhe dois murros. 

Alexandre Vieira foi detido, juntamente com os doze operários, e levado para o Governo Civil, onde permaneceu uma semana e foi submetido a diversos interrogatórios policiais. Em 10 de Março, passou para o Forte de Monsanto e, em 14 de Maio, seguiu, sozinho, para a Cadeia do Limoeiro, sendo libertado, sob fiança e a aguardar julgamento, dois dias depois.

O SR. ALEXANDRE VIEIRA, QUE AGREDIU O SR. DR. FIDELINO DE FIGUEIREDO (DIRECTOR DA BIBLIOTECA) COM UM TINTEIRO, RESPONDENDO PERANTE O TRIBUNAL

[Alexandre Vieira || Junho de 1927 || ANTT || PT/TT/EPJS/SF/001-001/0005/0769B]

O julgamento realizou-se no Tribunal da Boa Hora em 23 de Junho de 1927, sendo o advogado de defesa Amílcar da Silva Ramada Curto [06/03/1886 - 15/10/1961] e tendo por testemunhas Afonso Lopes Vieira [26/01/1878 - 25/01/1946], António Augusto Ferreira de Macedo [1887 - 1959], Aurélio Quintanilha e José de Figueiredo [21/12/1872 - 18/12/1937]. Foi condenado a 30 dias de prisão.

No ano seguinte, participou, "como delegado fraternal", no Congresso da Internacional Sindical Vermelha realizado em Moscovo, disso dando conta no livro Delegacia a um congresso sindical [1960].

Alexandre Vieira continuou a intervir civicamente no âmbito da Universidade Popular Portuguesa, conjuntamente com Augusto Carlos Rodrigues, Avelino Henriques da Costa Cunhal [28/10/1887 - 19/12/1966], Bento de Jesus Caraça [18/01/1901 - 25/06/1948], José Carlos de Sousa e Luís Hernâni Dias Amado [19/01/1901 - 22/01/1981]. 

Faleceu em 26 de Dezembro de 1973, com 93 anos de idade e a 4 meses de viver em plena Liberdade.

[João Esteves]

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