* Maria Cesarina Martins Tavares Gonçalves de Castro ou o discreto trabalho na retaguarda *
[Fotografia cedida por uma sobrinha, Maria Eduarda Castro, para a Biografia de Antifascistas da Resisitência]
[https://www.facebook.com/FascismoNuncaMais/photos/p.953945714714808/953945714714808/?type=3&theater]
Pelo Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, fundado há cem anos, em 1914, e encerrado pela ditadura salazarista em 1947, passaram três grupos distintos de mulheres: o primeiro, conotado com o republicanismo, com intervenção durante a Monarquia e os primeiros anos da República; o da década de 1920, que incluiu as primeiras jovens estudantes universitárias ou recém-licenciadas, como Elina Guimarães [1904-1991] [0558, 0559]; e o da década de 1940, quando a organização ganhou novo fôlego com o aproximar da derrota do nazismo e a liderança de Maria Lamas [1893-1983].
Nos três grupos, as mulheres que aderiram, filiando-se formalmente, apresentam vivências únicas, a maioria das quais por redescobrir.
No caso das mulheres que se empenharam nos anos 40 – várias centenas encontram-se já recenseadas – há, na maioria das situações, ligações, ora explícitas ora clandestinas, aos movimentos de oposição ao salazarismo e ao Estado Novo.
Cada nome representa uma vida por recontar. E quando se descortinam as redes familiares, profissionais e de sociabilidades encontram-se conexões surpreendentes.
É o caso de Maria Cesarina Martins Tavares Gonçalves de Castro.
Compareceu, entre novembro de 1945 e junho de 1947, a 18 reuniões do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas [v. Célia Costa, O Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (1914-1947) - uma organização feminista], tal como Maria Alda Nogueira [1923-1998], entre outras, e ocupou o cargo de Tesoureira na última direção eleita (25/06/1946), sendo aquela presidida por Maria Lamas.
Depois o seu nome, praticamente ignorado atualmente, desaparece com a proibição do CNMP.
Só que este nome, aparentemente “irrelevante” como tantos outros, já que parecia não sobressair entre as que se empenhavam ativamente na luta oposicionista, desempenhou, com o marido – Mário da Costa Carvalho Gonçalves de Morais e Castro –, importantíssimo trabalho de retaguarda de proteção aos principais dirigentes do Partido Comunista na clandestinidade e que, não raras vezes, faziam da sua casa porto de abrigo seguro.
Filha de José Eduardo Tavares, de origem aristocrática alentejana que abandonou a lavoura para se instalar em Lisboa por questões sentimentais, onde cursou Veterinária, e de Antónia Adelaide Martins, nasceu na capital a 9 de junho de 1912.
Segundo o filho, o advogado e ator José Armando Tavares de Morais e Castro [30/09/1939-22/08/2009], frequentou um colégio, onde foi colega de Beatriz Fogaça, irmã mais velha de Júlio Fogaça, tinha uma formação católica apostólica romana e chegou a pensar ser freira, tendo, pelo casamento com Mário da Costa Carvalho Gonçalves de Morais e Castro [n. 19/03/1914] e convívio com a família deste, nomeadamente o primo Armando de Castro [Armando Fernandes de Morais e Castro, 18/07/1918-16/06/1999], modificado a forma de pensar e virado à esquerda.
Na entrevista concedida a Miguel Medina [1951-2006] por José Morais e Castro, este afirma que tanto o pai – republicano, apoiante da campanha presidencial de Norton de Matos – como a mãe terão entrado para o Partido Comunista através do convívio com Aníbal da Silva Bizarro [n. 21/02/1908], ex-tarrafalista [1937-1944] empregado na Philips onde Mário de Morais e Castro era secretário da administração, passando a casa, sita em Campo de Ourique, a funcionar como local de apoio do Comité Central.
Pela residência passaram vários e relevantes dirigentes comunistas: Álvaro Cunhal [1913-2005], Américo de Sousa [1918-1993], António Dias Lourenço [1915-2010], Francisco Martins Rodrigues [1927-2008], Jaime Serra [n. 1921], Joaquim Pires Jorge [1907-1984], José Dias Coelho [1923-1961], Júlio Fogaça [1907-1980], Octávio Pato [1925-1999], Sérgio Vilarigues [1914-2007], entre outros.
Aquando da fuga de Peniche, Álvaro Cunhal chegou a estar refugiado naquela casa cerca de um mês com Isaura Moreira e a filha de ambos, de escassos meses.
Curiosamente, a casa funcionaria também como tesouraria do Partido Comunista, tendo Maria Cesarina Martins Tavares Gonçalves de Castro desempenhado exatamente o cargo de Tesoureira quando integrou o CNMP.
Devido à importância que a casa tinha, não era possível aos seus donos e ocupantes exercerem quaisquer outras atividades políticas em simultâneo, percebendo-se, assim, por que razão o nome de Maria Cesarina é ainda tão pouco referenciado. No entanto, devia ser das pessoas que teria muito a contar, já que raras terão sido as casas por onde passaram tantos e tão variados dirigentes de épocas distintas, sem que tenha sido alguma vez identificada pela polícia política.
Refira-se que o tio do marido, Amílcar Gonçalves de Morais e Castro [n. 1896] esteve várias vezes preso e a sua mulher, Irene Fernandes de Morais e Castro [1895-1975], presidiu à seção do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz.
Maria Cesarina Castro faleceu em 30 de Julho de 1995.
Maria Cesarina Castro faleceu em 30 de Julho de 1995.
[João Esteves]
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