[07/04/1915 - 17/08/1993]
Advogada e jurista, Alcina Bastos é mais um nome que tem sido estranhamente esquecido tanto pelo periodismo mediático como pela historiografia contemporânea, apesar de ter sido uma das poucas advogadas de presos políticos e da activa participação na campanha presidencial do general Humberto Delgado [15/05/1906-13/02/1965] em 1958, sendo, não raras vezes, a única mulher a marcar presença nas mesas das sessões políticas então realizadas, apesar de se omitir a sua identificação.
Desde muito nova que Alcina Bastos, até por motivos familiares já que o pai, republicano, conspirou contra o salazarismo e foi condenado a quatro anos de prisão, se associou a quase todas as principais iniciativas de combate às ditaduras salazarista e marcelista, sempre com enorme coerência e dignidade, mantendo a mesma intervenção cívica nos quase 20 anos que viveu em democracia na sequência da revolução de Abril de 1974.
Filha de Filomena de Sousa Vilarinho Bastos e de Adelino Soares Bastos, professor e inspetor escolar, nasceu em Fiães, concelho de Vila da Feira, a 7 de abril de 1915.
Fez a instrução primária na terra natal, frequentou o Colégio dos Carvalhos e, entre 1934-1935 e 1939-1940, cursou a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, onde se licenciou e deu colaboração ao Socorro Vermelho Internacional (SVI).
Inicialmente, exerceu a advocacia no Porto, Espinho e Vila da Feira. Aí aderiu ao Movimento de Unidade Democrática (MUD) e militou na Delegação do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz, onde era a sócia n.º 211.
Em 1949, empenhou-se na candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República e, em 1958, integrou, juntamente com o irmão Joaquim Bastos, também advogado, a equipa que promoveu e organizou a candidatura presidencial do general Humberto Delgado, de quem foi colaboradora próxima e a quem procurou honrar a memória póstuma. Esteve directamente envolvida no processo que procurou fundir as candidaturas de Arlindo Vicente [05/03/1906-24/11/1977] e a de Delgado.
Após as eleições, fez parte da Comissão Permanente do Movimento Nacional Independente (MNI), criado pelo general em 18 de junho, e desempenhou cargos no Centro Republicano António José de Almeida e Centro Escolar Republicano Almirante Reis.
Solidária, defensora, enquanto advogada, de vários presos políticos, integrou a Liga Portuguesa dos Direitos do Homem.
Reconquistada a liberdade, empenhou-se no julgamento dos assassinos de Humberto Delgado, marcando presença nas audiências dos agentes da PIDE, e na trasladação dos restos mortais do general para Portugal e, depois, para o Panteão Nacional.
Após o 25 de Abril de 1974, aderiu ao Movimento Democrático Português (MDP), onde se manteve entre 1975 e 1979; participou no Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC); interveio no âmbito da União dos Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), de que fora uma das fundadoras e dirigente; tornou-se sócia da Associação das Mulheres Juristas; e integrou o Conselho Nacional do Movimento Democrático de Mulheres, eleita no II Congresso (1980) e no III Congresso (1984).
Casada com o militar republicano Armando Pereira de Castro Agatão Lança [19/08/1894-23/05/1965], também interveniente ativo nas conspirações para derrubar o regime que pôs fim à I República, teve uma filha (n. 1955) que seguiu o mesmo trajecto profissional da mãe.
Aquando da sua morte preparava um livro sobre o assassinato de Humberto Delgado.
Faleceu em 17 de Agosto de 1993, tendo o voto de pesar aprovado pela Assembleia da República sublinhado que “o seu nome, ultimamente, aparecia pouco nas colunas da imprensa. Esquecimento injusto, porque Alcina Bastos foi uma das personalidades cuja intervenção na vida nacional, nos difíceis anos do fascismo, se caracterizou por uma firmeza e uma coerência exemplares”.
Quis ser enterrada com a sua toga no Cemitério dos Prazeres e, um ano depois, a título póstumo, foi-lhe atribuída a Ordem da Liberdade.
[João Esteves]
Sem comentários:
Enviar um comentário