[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

domingo, 29 de novembro de 2020

[2429.] ADALBERTO GASTÃO DE SOUSA DIAS [I] || DEPORTADO PARA S. TOMÉ, AÇORES, MADEIRA E CABO VERDE, ONDE FALECEU

 * ADALBERTO GASTÃO DE SOUSA DIAS *

[1865 - 28/07/1935]

O general Sousa Dias foi dos poucos oficiais de alta patente a não aderir ao golpe militar de 28 de Maio de 1926 e que desde o início procurou combater a Ditadura Militar.

Chefiou o movimento revolucionário de 03/02/1927 e foi deportado para S. Tomé (1927) e Açores (1928-1929). Em 1930, Voltaria a ser deportado para os Açores e, depois, para a Madeira onde, em 04/04/1931, por ser o oficial de mais alta patente, foi escolhido para chefiar a sublevação contra a Ditadura e assumir o comando da "Junta Militar".

Novamente preso, foi demitido do Exército e deportado para Cabo Verde: levado, primeiro, para o Campo de Concentração de Presos Políticos de São Nicolau, aí permaneceu até 21/08/1931; foi, depois, transferido para a ilha de Santo Antão e, por fim, para a de São Vicente, onde faleceu no hospital em 28/07/1935 e não em Junho de 1934 como tem sido referido. Os seus restos mortais chegaram a Portugal em 30/11/1935, tendo sido sepultado na Guarda em 03/12/1935.


Chaves (ou Guarda), 03 ou 31/12/1865 [consoante as fontes], General. Filho de Ana Albina Sampaio de Sousa Dias, de Chaves, e de José Maria de Sousa Dias, Oficial do Exército, natural de Lisboa. 

Estudou em Vila Real (liceu – 1875/1880) e na Universidade de Coimbra (1881-1883), onde fez os preparatórios para a Escola do Exército ingressando, de seguida, nesta instituição, em Lisboa (1883-1887). 

Fez carreira militar na arma de Infantaria: alferes (1889); tenente (1895); capitão (1902); major (1906); tenente-coronel (1915); coronel (1918); general (1924). 

Assumiu-se, sempre, como republicano, filiando-se no Partido Democrático após a revolução de Outubro de 1910. Combateu as tropas monárquicas de Paiva Couceiro (1912), não apoiou a ditadura de Pimenta de Castro, recusando qualquer colaboração (1915), esteve temporariamente detido durante o Sidonismo e colocado no Regimento de Infantaria de Reserva n.º 18, no Porto e, em Janeiro de 1919, aquando da revolta monárquica, recusou-se a prestar fidelidade à Monarquia e ao rei, combatendo a “Monarquia do Norte”. Iniciou, então, a sua vida política activa, sendo eleito deputado pelo Porto (1921, 1923, 1924).

Condecorado com os graus de Grande-Oficial da Ordem Militar de Avis (1920), Comendador da Ordem Militar de Cristo (1923) e Comendador da Ordem Militar de Santiago de Espada (1924). 

Comandante, desde 1925, da 3.ª Divisão do Exército, sediada no Porto, não aderiu aos revoltosos de 28 de Maio de 1926, tentando mesmo combatê-los, sem sucesso, devido à elevada adesão àqueles de várias unidades sob o seu comando. Dos raros Oficiais a não pactuar com rebelião militar de Gomes da Costa iniciada em Braga, pediu a exoneração e passou, de imediato, a combater a Ditadura Militar. 

Embora se encontrasse sob prisão e com baixa no Hospital Militar do Porto, foi indigitado para chefiar a revolta que eclodiu naquela cidade em 03/02/1927. Fracassada aquela, foi detido e deportado para S. Tomé: juntamente com outros implicados, embarcou, em Leixões, no "Infante de Sagres e, de regresso à capital, fez transbordo para o barco "Lourenço Marques", no qual seguiu para São Tomé. Este vapor saiu no dia 21/02/1927, à noite, levando deportados com destino aos Açores, Cabo Verde, Guiné e Angola, tendo aportado em S. Tomé aproximadamente em 12/03/1927 [ANTT, PT/TT/MI-DGAPC/2/700/138]. 

Em Novembro de 1927, o Conselho de Ministros deliberou a sua transferência imediata para Ponta Delgada, via Funchal, decisão transmitida ao general em 29 desse mesmo mês. Foi ainda informado que embarcaria no vapor Nyassa em 01/12/1927, data em que este este transporte passaria por S. Tomé, fazendo, depois, escala na Madeira. Sousa Dias ainda contestou essa decisão, por não querer abandonar os seus camaradas de desterro, sobretudo aqueles que tinham servido sob as suas ordens no movimento revolucionário de 03/02/1927, disso dando conta a todos os núcleos de deportados espalhados pelas Ilhas e Colónias. 

[in O General Sousa Dias e as Revoltas contra a Ditadura – 1926/1931, organização de A. H. de Oliveira Marques, com a colaboração de A. Sousa Dias || Publicações Dom Quixote || Abril de 1975]

Depois de passar pelo Funchal, onde há uma fotografia sua entre vários deportados políticos, chegou, em Dezembro de 1927, ao Faial, ilha onde lhe tinha sido fixada residência obrigatória. 

Em 1929, foi mandado regressar ao Continente, submetido a julgamento no Tribunal Militar Especial, reunido no Forte da Graça, em Elvas, em 13/04/1929 e condenado a dois anos de prisão, tendo sido descontado o tempo em que esteve deportado. 

Apesar de já ter cumprido o tempo da pena a que fora condenado, regressou, em 1930, à mesma ilha açoriana por lhe ter sido aí fixada residência e, em seguida, deportado para o Funchal onde, em 04/04/1931, por ser o oficial de mais alta patente, foi escolhido para chefiar a sublevação contra a Ditadura e assumir o comando da “Junta Militar”. 

Falhada a revolta, foi novamente preso, demitido do Exército, sem direito a pensão, honras e uso de medalhas militares e condecorações, e deportado para Cabo Verde. 

Desembarcou na cidade da Praia, ilha de Santiago, e levado, juntamente com os outros deportados, mais de trinta, civis e militares, para o Lazareto, «onde nos meteram, cercado de arame farpado, pregando-nos as janelas, guardados por soldados pretos, numa aglomeração a mais anti-higiénica; dando-nos uma água insalubre para beber, em que se encontravam vários vermes em suspensão; e uma vala comum, sem escoante onde, sem distinção, todos íamos satisfazer as nossas necessidades corporais» [carta ao filho Adalberto, datada de 21/08/1931, in O General Sousa Dias e as Revoltas contra a Ditadura – 1926/1931, organização de A. H. de Oliveira Marques, com a colaboração de A. Sousa Dias, Publicações Dom Quixote, Abril de 1975].  

Terá ficado ali cerca de um mês e, em 6 de Junho de 1931, embarcou para a ilha de S. Nicolau, onde chegou no dia seguinte, ao anoitecer. Levado para o edifício do Seminário, um velho casarão de dois andares,  aí chegaram a estar, ao todo, «cerca de 170 presos políticos», guardados pela «força indígena vinda de Angola» e «40 guardas civis, com dois subchefes e um chefe», idos de Lisboa: «Nunca presumi que se encerrasse um general dentro dum restrito campo de prisioneiros políticos, cercado de arame farpado, ou de um muro de 5m de altura (como no Seminário de S. Nicolau), sujeitando-o aos mais mesquinhos vexames, e aos mais insólitos enxovalhos».

Como bem lembra José J. Cabralestudioso sobre a deportação e Estado Novo em Cabo Verde, o corredor interior ao longo de todo o edifício foi baptizado pelos deportados "avenida General Sousa Dias" e, recorrendo-se do livro do historiador A. H. de Oliveira Marques sobre este, refere que ele passava dias a fio deitado na cama, outros tantos, desolado, a deambular pelo corredor, em resultado do não atendimento de denúncias que fazia, de maus tratos a que todos eram submetidos, dos colegas tuberculosos a contaminarem os outros. 

Permaneceu em S. Nicolau até 21 de Agosto. Depois, foi transferido, sem saber porquê, «visto não ter pedido, nem directa nem indirectamente; nem tão pouco consinto que se peça, para a Ponta do Sol na Ilha de Santo Antão» onde, «ao menos aqui, já respiro!» [carta citada]. Na viagem, pode observar o local onde se iria «organizar um novo Campo de Concentração na Ilha de S. Nicolau num sítio conhecido pelo nome de Tarrafal», já em construção e que «excederá tudo o que até se tem praticado». 

[No entanto, não terá sido concluído, apesar do plano inicial, sendo visíveis quatro casas desmontáveis, adquiridas ao estrangeiro, e os postes para ser pregada a vedação de arame farpado. Muito deste material seria, depois, reutilizado no Tarrafal de Santiago, aberto em 1936.  Para todos os efeitos, as condições físicas e psicológicas vividas quotidianamente pelos deportados no Seminário/Prisão de S. Nicolau, sob isolamento, regras de clausura, repressão, incomunicabilidade, acomodação, censura, restrições, vigilância policial e despotismo arbitrário e humilhante [Victor Barros, Campos de Concentração em Cabo Verde - As Ilhas como espaço de Deportação e de Prisão no Estado Novo, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2009], fez com que acabasse por ficar conhecido como o Campo de Concentração de Presos Políticos de S. Nicolau.]

Foi um dos militares que não foi, explicitamente, abrangido pela amnistia decretada em 05/12/1932 (Decreto 21.943) e continuou, mesmo em terras longínquas, a combater a Ditadura Militar, mantendo, dentro do possível, contactos com civis, ex-militares e militares. 

Por fim, adoeceu em Santo Antão e, devido ao agravamento do seu estado de saúde, foi transferido para o hospital de S. Vicente, onde faleceu em 28/07/1935, disso dando conta um telegrama enviado pelo Governador de Cabo Verde ao Ministro das Colónias [ANTT, PT-TT-MI-GM-4-14-559_c0006]. 

Em vésperas do seu falecimento, o Governador tinha enviado ao mesmo ministro o seguinte telegrama: «rogo vexa transmitir Ministério Interior creio ser máxima conveniência repatriação imediata ex-General Sousa Dias está gravemente doente. É conveniente repatriar maior número de deportados possível» [ANTT, PT-TT-MI-GM-4-14-559_c0007]. 

Em Agosto de 1935, foi autorizada a sua trasladação para a Guarda [ANTT, PT-TT-MI-GM-4-32-44], tendo os restos mortais chegado a Lisboa, a bordo do vapor “Guiné”, em 30/11/1935. 

[Adalberto Gastão de Sousa Dias || Diário de Lisboa || 02/12/1935] 

A urna foi coberta com a bandeira nacional, transportada aos ombros de antigos companheiros da deportação em África e na Madeira e encaminhada para a Estação do Rossio, «onde foi colocada num vagão armado em câmara ardente que, atrelado ao comboio correio da Beira Baixa, seguiu, às 23 horas, para a Guarda, terra natal do extinto» [Diário De Notícias, “General Sousa Dias – Os seus restos mortais chegaram de Cabo Verde e seguiram para a Guarda”, 03/12/1935]. 

Foram organizados vários turnos e estiveram presentes, entre muitos outros, Alfredo Guisado, António Augusto, António Joaquim Pires, António Lomelino, Arantes Pedroso, Armando do Vale, Augusto César Loureiro, Aurélio Daniel, Avelino Cascais, Carlos Américo Garcez, Carlos Babo, Carlos Köpke [Carlos Alberto Coque], Carvalhão Duarte, Carvalho Araújo, César Nunes, Edmundo Gonçalves Lamego, Eduardo Bravo, Eduardo França Borges, Eduardo Pinto de Sousa, Eugénio Ferreira, Francisco de Aragão e Melo, Heitor Ferreira, Herculano Vasco, João Augusto Sousa (reverendo), João de Sousa, Joaquim Bento, José Maria Antunes, José Sebastião Frescata, Joubert Pereira, Julião Custódio, Júlio Anjos, Lopes Andrade, Lúcio Escórcio, Lúcio Martins (capitão), Manuel Martinho, Manuel Moutinho, Manuel Roberto, Marinho da Silva, Martins dos Santos, Maurício Costa, Máximo Barros, Pereira Vitorino, Ramon de La Féria, Ribeiro de Carvalho, Rogério Soares, Roque da Silveira, Sá Cardoso (general), Simões Raposo, Vieira Marques, Viriato de Almeida e Zeferino da Silva.

Três anos após o 25 de Abril, por Decreto do Conselho da Revolução de 02/06/1977 (decreto 232/77), foi reintegrado, a título póstumo, no Exército e no seu posto de General, com todas as honras ao mesmo inerentes e o direito às condecorações e graus honoríficos que possuía. 

Em 1980, recebeu o grau de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade.

[João Esteves]

1 comentário:

AIRES BARATA HENRIQUES disse...

Caro João Esteves,
Dou-lhe os parabéns pelo trabalho que desenvolve neste blog, de que só recentemente tive conhecimento.
Sou co-autor de uma pequena obra “Pestana Júnior, Profeta Republicano”, onde se aborda superficialmente a vida do DR. Manuel Gregório Pestana Júnior, natural do Porto Santo e que, nos anos de 1924/1925, foi membro do Partido da Esquerda Democráica de José Domingues dos Santos, um dos responsáveis da Revolta da Madeira e vítima da política de deportações da Ditadura.
Terei todo o gosto em lhe remeter um exemplar do mesmo, caso não disponha já de um.
Foi um trabalho feito há quase 20 anos e que aguarda melhor oportunidade para ser completado. Ele foi um dos companheiros do general Adalberto Gastão de Sousa Dias na revolta da Madeira e, tal como ele, deportado para a Ilha do sal.
Agradeço-lhe assim também a ajuda possível no sentido de concretizar esse desiderato.
Aproveito também para lhe dar conta de que sou proprietário em Pedrógão Grande de um pequeno Museu da República e Maçonaria, onde disponho de alguns materiais fotográficos sobre o período da República e Estado Novo.
Sou Aires Henriques, e os m/ possíveis contactos são: geral@avillaisaura.com
e Telem. 919856297