[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

[3014.] MANUEL TAVARES || MILITANTE DO PARTIDO COMUNISTA E DEPORTADO PARA A GUINÉ, ONDE FALECEU EM 1925

 * MANUEL TAVARES *

[06/10/1898 - 22/07/1925]

[Manuel Tavares || F. 20/08/1923 || ANTT || PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-1-NT-8902 || "Fotografia cedida pelo ANTT"]

Manuel Tavares nasceu no dia 6 de outubro de 1898 em Maçainhas, Belmonte.

Filho de Ana Angélica Tavares e de Manuel Antão Tavares, residia na Rua Capitão Leitão ou Largo do Olival, em Lisboa.

Joaquim Rodrigues, em "O Comunista" de 15/08/1925, ao anunciar a notícia do falecimento de Manuel Tavares adianta vários elementos:

- Militante do Partido Comunista Português "quasi" desde a sua fundação, foi membro do Secretariado da Comuna Nº1 «Tibério Graco», do Beato e Olivais (Lisboa).

- Barbeiro, «foi militante ativo da sua classe e cuja direcção chegou algumas vezes a pertencer».

- Era casado e tinha dois filhos, «um dos quais nasceu já depois da sua deportação».

Foi preso em 1923, 1924 e 1925.

Preso em 22/05/1924, "por ser bombista e agitador".

Segundo o jornal “A Capital”, de 23/06/1924, «uma brigada de agentes da polícia de investigação tem procedido nos últimos dias a várias diligências sobre os indivíduos que se encontram presos no presídio da Trafaria como implicados em vários atentados. O "Avante" e os seus companheiros em número de vinte, foram já largamente interrogados, devendo ser enviados em breves dias ao Tribunal da Boa Hora por se ter apurado a sua conivência em diferentes atentados. Seis dos presos vão ser restituídos à liberdade por nada se ter apurado que os comprometa.».

Manuel Tavares foi libertado em 25/06/1924.   

Preso em 20/04/1925, "por pertencer à Legião Vermelha e ter tomado parte em diversos atentados dinamitistas".

No dia 30/04/1925, às 2h00, Manuel Tavares sai do calabouço número 6 do Governo Civil e embarca no Cruzador Carvalho Araújo na companhia de 17 "presos sociais": o navio levanta ferro cerca das 3h15. À porta do Governo Civil e da Cadeia do Limoeiro juntam-se as famílias «dos indivíduos deportados que seguiram só com as roupas que tinham consigo».

[Cruzador Carvalho Araújo || 1921]

No dia 06/05/1925, os dezoito presos são trasladados do Cruzador Carvalho Araújo para a Fortaleza de Angra do Heroísmo.

Em 16/05/1925, deu-se uma revolta: «Segundo notícias recebidas de Angra, os legionários que ali se encontram insubordinaram-se no dia 16 pelas 21 horas, na caserna da 4ª companhia do regimento de infantaria 25, que lhes servia de prisão, quebrando os vidros, barras de ferro das camas, rasgando as enxergas, escavacando as prateleiras e arrancando uma tábua do sobrado para desta maneira se poderem evadir pelo quarto do sargento.» [in jornal "A Época", de 29/05/1925]

No dia 03/06/1925, Vitorino Guimarães, Presidente do Ministério, informa no Parlamento: «Dos indivíduos enviados para Angra alguns ficam ainda em Angra, outros seguem para Cabo Verde a outros seguem para a Província da Guiné, vão nesses três pontos esperar pelo julgamento.» [in Diário da Câmara dos Deputados]

No dia 08/06/1925, o Cruzador Carvalho Araújo chega à Ilha de São Vicente (Cabo Verde).

Em 19/06/1925, José Domingues dos Santos intervém na Câmara dos Deputados acerca dos deportados: «Os homens da Legião Vermelha que praticaram crimes, ou de tal são acusados, têm de ser julgados. Mas deportá-los só pela informação policial, não!».  [in Diário da Câmara dos Deputados

[Degredados || Renovação, Vol. 1, Nº 10 || 15/11/1925]

Em 18/07/1925, Manuel Tavares, deportado nº 239, falece na Ilha de Cunhabaque, no Arquipélago dos Bijagós - Guiné-Bissau.

Quatro dias depois, em 22/07/1925, Manuel Duarte Pereira, deportado nº 243, morre na Ilha de Cunhabaque.

No dia 23/07/1925, dá-se a morte do deportado n.º 260, João Nunes Carreira, mais conhecido pelo "Número", na Ilha de Cunhabaque.

Em 30/07/1925, o jornal "A Capital, Diário Republicano da Noite" refere que treze dos deportados para a Guiné foram para o Arquipélago dos Bijagós, onze para Cunhabaque e dois para Bubaque e acrescenta: «Todos os presos que se encontram nesta Ilha (Cunhabaque) estão ocupados na construção de estradas». Os restantes deportados estão em Bolama.

No mês seguinte, em 24/08/1925, o Diário de Lisboa é visitado por «uma comissão de pessoas de família dos deportados por questões sociais [...] a comissão pede que os Tribunais tragam para Lisboa os incriminados e os julguem.» O jornal confirma a morte de Manuel Tavares, Duarte Pereira, padeiro, e João Carreira, descarregador; adianta, igualmente, que «sete dos deportados na Guiné e alguns de Cabo Verde estão atacados de febres.»

Em 10/10/1925, “Na Polícia de Segurança do Estado foi hoje de tarde recebido um ofício do Governador da Guiné, datado de 30 de setembro último comunicando terem falecido na Ilha de Cunhabaque João Nunes Carreira (o "Número"), Manuel Duarte Pereira e Manuel Tavares o primeiro era acusado de estar implicado no atentado contra o Comissário Geral da Polícia, e os restantes de serem bombistas e militantes do Partido Comunista.” [in "A Capital"]    

Em 23/10/1925, continuam as mortes: falece José Alves dos Santos, o José da Carqueja, no Hospital de Bolama.

Em 24/10/1925, segundo carta enviada por um particular, residente em Bolama, para o Diário de Lisboa, «Os deportados estão todos agora em Bolama, visto que já regressaram das Ilhas de Canhabaque os que ali se encontravam. José Gomes Pereira "O Avante" que se encontra há algumas semanas no Hospital, em estado grave, tem frequentes delírios. No Hospital além do Avante encontram-se os deportados Raul Honório nº 254 [...] e José Rodrigues de Almeida nº 251 com febres de África.»

[Manifestação frente ao Parlamento || Renovação, Vol 1, N.º 13 || 01/01/1926]

Em 21/12/1925, «As classes trabalhadoras foram hoje ao Parlamento protestar contra as deportações, tendo havido tiros, pranchadas e pedradas» [Diário de Lisboa]. A "Comissão pró-regresso dos deportados" entrega no Parlamento uma mensagem dirigida ao Presidente da Câmara dos Deputados solicitando o regresso dos deportados. A mensagem refere «Há já males irreparáveis, pois que em virtude da surdez dos governos ou da sua pusilanimidade em presença de ameaças de certas castas que se julgam no direito de se sobreporem aos poderes do Estado, alguns desses deportados, sem julgamento e sem processo regular - por lá pareceram - quem sabe se inocentes!!...»

Segundo José Casanova, Manuel Tavares terá sido, muito provavelmente, o primeiro de uma longa lista de militantes comunistas assassinados nas prisões. 

Nota: O médico alemão Dr. Fritz Rennefeldt, encarregado do Hospital da Companhia Agrícola e Fabril da Guiné, em 1927-1928, concluiu que o centro e sul da Ilha de Canhabaque eram o epicentro da Febre Amarela na Guiné-Bissau; relatórios internacionais adiantam que mais de 30% dos casos ocorridos no Arquipélago dos Bijagós entre 1920 e 1934 acabavam por ser letais. 

[Daniel Tavares Nicolau e
João Esteves]

Esta biografia não teria sido possível sem a excelente e exaustiva pesquisa de Daniel Tavares Nicolau, sobrinho-neto de Manuel Tavares, que prontamente a disponibilizou e, assim, muito contribui para a preservação da memória e legado de um dos muitos deportados vítima das políticas sociais da 1.ª República. 

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