* AMÉRICO GONÇALVES DE SOUSA *
[1918 - 1993]
Dirigente do Partido Comunista, totalizou cerca de 16 anos nas prisões salazaristas e 19 de intensa e continuada luta clandestina, tendo sido deportado para o Tarrafal com 18 anos.
[Américo Gonçalves de Sousa || 1935 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209d]
Militante e dirigente do Partido Comunista, tendo integrado o seu Comité Central, Américo Gonçalves de Sousa, “O Russo”, iniciou muito novo a actividade política, esteve várias vezes preso e conheceu as principais prisões [Aljube, Peniche, Caxias, Tarrafal], sendo enviado, com apenas 18 anos, para o Campo de Concentração do Tarrafal.
Fundidor de profissão, era filho de Maria Gonçalves e de Joaquim Mário de Sousa, nasceu em Lisboa, na freguesia de Santo Estêvão, em 18 de Julho ou 3 de Agosto de 1918, constando esta dúvida na Biografia Prisional da autoria da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE) / Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE).
A sua militância política iniciou-se na Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas (FJCP), quando trabalhava no Arsenal da Marinha, e prolongou-se por décadas, tendo sofrido a violência da ditadura mal completara os dezassete anos.
Preso pela primeira vez em 7 de Setembro de 1935, por actividades comunistas, Américo de Sousa percorreu, em escassos meses, o Aljube, Peniche e de novo o Aljube, de onde partiu para o Tarrafal: detido inicialmente numa esquadra, foi transferido para a Cadeia do Aljube em 30 de Dezembro e, em 28 de Abril de 1936, para a Fortaleza de Peniche, regressando ao Aljube em 6 de Maio, data em que foi julgado e condenado pelo Tribunal Militar Especial a 18 meses de prisão correccional.
[Américo Gonçalves de Sousa || 1935 || ca-PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-4-NT-8904_m0042 || "Imagem cedida pelo ANTT"]
Apesar de “só” faltarem cumprir 301 dias, foi enviado em 17 de Outubro para o Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, integrando o grupo de presos que o inaugurou em 29 do mesmo mês.
Cumprida a pena a que fora condenado, continuou em prisão preventiva no Tarrafal, de onde só regressou em 15 de Julho de 1940, sendo então «restituído à liberdade por ter sido amnistiado» [RGP/1697].
Voltou à luta política e escassos meses, ainda em 1940, integrou, com Joaquim Pires Jorge [28/11/1907 - 06/06/1984], José Gregório [19/03/1908 - 1961], Júlio de Melo Fogaça [10/08/1907 - Janeiro de 1980], Manuel Guedes [14/12/1909 - 08/03/1983], Militão Bessa Ribeiro [13/08/1896 - 02/01/1950] e Sérgio Vilarigues [23/12/1914 - 08/02/2007], o primeiro grupo que procurava a reorganização do Partido Comunista [JPP, Álvaro Cunhal – Uma biografia política, vol. 2, 1941-1949]. No ano seguinte, era funcionário, tal como todos aqueles, usando o pseudónimo de “Abel”.
Em Julho de 1946, Américo de Sousa participou no II Congresso Ilegal do Partido Comunista realizado numa casa da Lousã com a ajuda do casal António Correia e Natividade Correia [esta também desenvolvera atividade importante no seio das secções de Coimbra/Figueira da Foz da AFPP e CNMP] e teve importantes funções no Comité Local de Lisboa (anos 40/50).
Américo Gonçalves de Sousa chegou a controlar o historiador Jorge Borges de Macedo [03/03/1921 - 18/03/1996], cuja esposa, Branca Braga de Macedo, militou na década de 40 na Associação Feminina Portuguesa para a Paz, desempenhando cargos nas direcções de 1947 e 1948.
[Américo Gonçalves de Sousa || 12/10/1955 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209c]
Quinze anos depois de se libertado do Tarrafal, em 29 de Setembro de 1955, quando era dirigente do Comité Local de Lisboa e destacado membro do Comité Central, foi preso em Lisboa e levado para o Aljube. Em 22 de Novembro passou para o Forte de Caxias, onde foi sujeito a continuados castigos.
[Américo Gonçalves de Sousa || 12/10/1955 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209c]
Em 3 de Fevereiro de 1957 regressou ao Aljube, cadeia de onde se evadiu na madrugada de 26 de Maio do mesmo ano com Carlos Brito e Rolando Verdial [a mãe deste, Emília Dionísia Ferreira dos Santos Silva Verdial, morreu em 7 de Outubro de 1960, no regresso de uma visita ao filho, então preso em Caxias. Segundo o jornal Avante!, de Novembro, o seu desaparecimento foi acelerado pela forma desumana e humilhante como a PIDE a tratou, não atendendo sequer à idade avançada da progenitora: começou por impedir a visita do dia 6 pelo facto de Emília e Mem Verdial, vindos do Porto, terem chegado minutos depois da hora regulamentar; no dia seguinte concederam-na, mas não foi permitida aos pais que se aproximassem do preso, o beijassem e abraçassem; e o desenlace fatal deu-se no regresso a casa, chegando já sem vida à sua residência] através da janela de uma enfermaria desactivada situada no último andar e para onde tinham sido enviados os presos mais perigosos: cortaram parte das grades e, após passarem por vários prédios, apanharam um táxi no Largo da Graça.
E porque não é possível haver resistência(s) sem mulheres, aquela fuga contou, entre outros, com o apoio da militante comunista Deolinda Franco.
Mais uma vez, Américo de Sousa regressou ao trabalho clandestino do Partido Comunista, continuando a integrar o Comité Central eleito no V Congresso realizado entre 8 e 15 de Dezembro de 1957. Então, entre as pessoas que controlaria estava o advogado Manuel João da Palma Carlos [24/06/1915 - 01/11/2001], ambos com papel de relevo na preparação das eleições presidenciais de 1958 [JPP, Álvaro Cunhal, vol. 3]. No âmbito do trabalho partidário no terreno, e segundo José Pacheco Pereira, Américo de Sousa defendeu a partir de certa altura a desistência de Arlindo Vicente enquanto candidato presidencial e o apoio a Humberto Delgado.
No ano seguinte, em Abril, integrou com Alexandre Castanheira [n. 1928] e Octávio Pato [01/04/1925 - 19/02/1999] a delegação do Partido Comunista que se reuniu em Itália com o Partido Comunista Italiano.
[Américo Gonçalves de Sousa || 18/12/1961 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209a]
Américo de Sousa voltou a ser preso a 15 de Dezembro de 1961, juntamente com Carlos Costa, quase cinco anos depois de andar fugido e ter regressado à clandestinidade, constando da sua ficha prisional a indicação que tinha na cara marcas de varíola para, assim, ser mais facilmente identificado.
[Américo Gonçalves de Sousa || 18/12/1961 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209a]
Nesta sua terceira prisão, voltou a fazer o percurso Caxias-Aljube-Peniche, prisão para onde foi transferido em 18 de Abril do ano seguinte por ter sido condenado, por cúmulo jurídico, a 4 anos.
O vaivém entre as prisões não pára, já que em 1 de Junho de 1964 entrou, mais uma vez, em Caxias de onde foi transferido, a 25 de Setembro, para Peniche.
No ano seguinte, em 23 de Fevereiro de 1965, foi condenado na pesada pena de oito anos e meio, supressão de direitos políticos por quinze e medidas de segurança de internamento de seis meses a três anos, prorrogável, as quais iniciou em Dezembro de 1968.
[Américo Gonçalves de Sousa || 18/12/1961 || ANTT || RGP/1697 || PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209]
Quase toda a década de 1960 foi passada em prisões, já que Américo de Sousa só seria libertado em 20 de Outubro de 1971, depois de ter estado preso consecutivamente quase dez anos.
Em 53 anos de idade, totalizou cerca de 16 anos nas prisões salazaristas e 19 de intensa e continuada luta clandestina.
Dirigente da URAP depois do 25 de Abril de 1974, faleceu em Março de 1993.
O nome consta do Memorial de Homenagem aos Ex-Presos Políticos, inaugurado na Fortaleza de Peniche em 9 de Setembro de 2017.
NOTA 1: Atenção ao uso indevido das imagens sem a devida autorização do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
NOTA 2: Actualização do texto publicado neste Blogue em 20 de Julho de 2014.
Obrigado a José Marcelino, também ele um resistente e ex-preso político, pela informação e documentação disponibilizadas.
Fontes:
ANTT, Registo Geral de Presos 1697 [Américo Gonçalves de Sousa / PT-TT-PIDE-E-010-9-1697_P4_m0209].
ANTT, Livro de Cadastrados - 4 / Fotografia 2994 [Américo Gonçalves de Sousa / ca-PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-4-NT-8904_m0042].
[João Esteves]
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