[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

[0162.] REIVINDICAÇÕES FEMINISTAS [II] || 27/10/1910 - OBRA MATERNAL

* REPRESENTAÇÃO DA OBRA MATERNAL AO MINISTRO DO INTERIOR || 27/10/1910 *

«Ex.mo Sr. Ministro do Interior do governo provisório da República Portuguesa.

Vai decorrido um ano, depois que a «Liga Republicana das Mulheres Portuguesas», no seu intuito de bem servir a Pátria e a Humanidade, resolveu criar uma instituição que, pelo ideal em que se inspirava, tinha tanto de moralmente higiénica como de socialmente redentora. Destinava-se esta instituição, nas suas linhas gerais, a combater a mendicidade infantil, exercida nas ruas da capital, com a cumplicidade trágica das noites tenebrosas, e o incentivo criminoso de vis exploradores da infância desprotegida.

Criou-se então, dentro da Liga, uma comissão especialmente dedicada a estudar o assunto e a pôr em prática os meios que se lhe afigurassem razoáveis, tendentes a conseguir a diminuição da mendicidade infantil. Essa comissão tem trabalhado constantemente, sem um momento de enfraquecimento ou de tibieza, e, apesar dos seus esforços se produzirem num meio difícil, quando as questões de interesse puramente partidário sobrelevavam todas as outras, é certo que a sua propaganda não resultou estéril – e os factos aí estão a comprová-lo – com a existência da «Obra Maternal», onde já foram recolhidas algumas crianças, que vagueavam pelas ruas implorando a caridade pública, por conta de quem as explorava.

Carece, porém, a «Obra Maternal» de ser desenvolvida por forma a corresponder ao ideal das suas fundadoras as quais, se o Governo provisório da República portuguesa quiser auxiliá-las, muito poderão contribuir, pela sua acção de combate contra a exploração de menores, para melhor e eficaz policiamento da cidade, - desde que se encontrem devidamente preparadas para arrancarem à vagabundagem todas as crianças que, dentro de um meio vicioso e corrupto, vão prestar mais tarde ao crime e à devassidão os seus deploráveis contingentes.

A «Obra Maternal» poderia ser verdadeiramente o seio generoso onde todas as outras instituições de assistência infantil se encontrassem. Jovem, como a jovem República, de onde proveio, ela seria a alma-mater da grande obra de solidariedade humana, que as modernas gerações em Portugal se propõem realizar.

A comissão executiva da «Obra Maternal» vem, pois, solicitar do Governo provisório o seu valiosíssimo e indispensável apoio, para que a instituição criada pela «Liga Republicana das Mulheres Portuguesas», e com tanta dificuldade mantida, se desenvolva e prospere como uma garantia de morigeração para a nossa capital.

Pedimos ao Governo provisório, certas de que o nosso apelo será escutado, que nos ceda um dos edifícios de que foram expulsas as congregações, com todo o mobiliário, roupas, etc., que nele se contiver, a fim de aí instalarmos a «Obra Maternal»; um subsídio anual estabelecido pelo Governo, e que o produto das multas policiais reverta em benefício da mesma instituição. – Saúde e fraternidade. – A comissão.»
 
 ["A obra da ‘Liga Republicana das Mulheres Portuguesas’” || O Radical || 17/11/1910]

[João Esteves]

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