[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

[1706.] MANUEL VIEIRA TOMÉ [I] || ASSASSINADO NO ALJUBE EM 1934

* MANUEL VIEIRA TOMÉ || 18 DE JANEIRO DE 1934 || MORTO NO ALJUBE *

Embora Manuel Vieira Tomé seja um dos primeiros opositores à Ditadura Militar e ao Estado Novo a morrer sob tortura, desconhece-se muito do seu percurso.  

Empregado de escritório dos Caminhos de Ferro Portugueses, Manuel Vieira Tomé estava identificado, desde 1920, como um dos mais importantes dirigentes sindicais dos ferroviários, actividade que manteve após a implantação da Ditadura Militar em 28 de Maio de 1926.

Envolvido em diversas acções revolucionárias contra a Ditadura e militante do Partido Comunista, foi, por diversas vezes, detido e teve destacado papel na Greve Geral de 18 de Janeiro de 1934, na sequência da qual foi preso em 16 de Abril e brutalmente espancado tendo, segundo a versão policial, sido encontrado enforcado na sua cela poucos dias depois.

[Fotografia retirada do livro Partido Comunista - 60 anos de luta || Edições Avante, 1984] 

Filho de Perpétua Jesus Oliveira Tomé e de Manuel Vieira Tomé, nasceu em 1887, em Tomar.

Ainda durante a República, foi identificado como um dos principais sindicalistas dos ferroviários, constando do seu Cadastro Político que "fazia parte do comité revolucionário da CP" [Setembro de 1920], integrava a "Comissão de Melhoramentos do pessoal da C.P., andando a reclamar melhoria de situação para a sua classe" [18/09/1920] e "era tido como o maior agitador da greve ferroviária, tendo como companheiros Luís de Andrade e Bernardino Fernandes" [08/10/1920].

Em 15 de Março de 1928, por "ordem superior", foi preso e entregue à Polícia de Informações do Ministério Interior (P.I.M.I,) de Santarém.

Por "estar implicado no complôt do Entroncamento", foi novamente detido em 1 de Abril e solto em 8 de Julho.

Dirigente do Sindicato dos Ferroviários de Lisboa e director do "Ferroviário", seu órgão, voltou a ser preso em 30 de Setembro de 1930, "por ser um agitador perigoso e por fazer parte de uma comissão encarregada de levar a efeito um congresso de trabalhadores de transportes, sabendo muito bem que esse congresso tinha em vista preparar uma greve geral de todos os meios de condução terrestres e marítimos" [ANTT, Cadastro Político]. Nesse contexto, em 2 de Outubro, houve a proposta de lhe ser fixada residência nos Açores, mas o despacho foi revogado e Manuel Vieira Tomé saiu em liberdade em 7 de Maio de 1931, já depois da reunião da Federação Nacional dos Trabalhadores dos Transportes e Comunicações, "com a presença de 2000 trabalhadores" [Luís Farinha, O Reviralho, 1998].

A partir de 1932, intensificou-se a intervenção sindical e política contra a Ditadura Militar, mantendo ligações com os comunistas Alberto Matias, José Sequeira Valentim e Manuel Alpedrinha.

Em Junho de 1933, continuava fugido à Polícia Política que o associa a reuniões conspirativas com Artur Guilherme Rodrigues Cohen, Carlos Filipe Rodrigues Consiglieri, o ex-capitão César de Almeida, João Antunes, João Lopes Soares, Manuel Jacinto,  Roque Laia, entre outros.

Aquando do movimento revolucionário de 18 de Janeiro de 1934,  manteve ligações com Coimbra através do ferroviário António Afonso Pereirafoi um dos responsáveis pelo descarrilamento de um comboio na Póvoa de Santa Iria.


[Diário de Lisboa || 18 de Janeiro de 1934]

Finalmente preso em 16 de Abril de 1934, faleceu poucos dias depois, talvez em 23 do mesmo mês, na sequência das torturas a que foi sujeito, havendo referências ao uso de choques eléctricos e terem-lhe sido arrancadas as unhas das mãos, e de uma greve de fome. 

Segundo a versão policial "suicidou-se por enforcamento na Cadeia do Aljube, servindo-se para esse efeito do cobertor que lhe estava distribuído, que rasgou em tiras" [ANTT, Cadastro Político, 1879]. No entanto, e não pode ser visto como um acaso, houve a preocupação da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado de descrever no seu Cadastro Político a sua perigosidade e a forma como se teria suicidado, anotações que, habitualmente, não constavam de outros registos policiais semelhantes.

O funeral de Manuel Vieira Tomé realizou-se em 27 de Abril de 1934.

Fonte: ANTT, Cadastro Político 1879.

 [João Esteves]


Acrescento 1: Antonia Gato, neta de António Gato Pinto, deu aqui um importante esclarecimento sobre o assassinato de Manuel Vieira Tomé:  «o meu avô escreveu o seguinte episódio sobre o dia (26 de abril de 1934) em que foi transferido da Trafaria para o Aljube: "Logo que ali entramos, fomos informados que no dia 18 de Abril dera entrada no segredo daquele estabelecimento prisional o camarada comunista Manuel Vieira Tomé, que aparecera enforcado na manhã de 21 para 22 de Abril de 1934. Conforme nos foi dito, enforcou-se com o cinto das calças, o que de forma alguma acreditamos pois tinham-lhe arrancado as unhas dos dedos da mãos e até tinha alguns dos dedos partidos, quanto ao corpo estava completamente negro de tanta pancada que levara na policia. A tão violentas torturas o sujeitaram, entre elas a do “capacete eléctrico”, pois além de queimaduras tinha também vários ossos quebrados, tal foi o sofrimento deste infeliz!" (Diário de António Gato Pinto, 1934)».

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