[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

[1060.] ALICE MODERNO [V]

* ALICE AUGUSTA PEREIRA DE MELO MAULAZ MONIZ MODERNO *

[11/08/1867 - 20/02/1946]

Poetisa, professora particular de Português e de Francês, jornalista, editora, tradutora, mulher de negócios, republicana e feminista.

Filha de Celina Pereira de Melo Maulaz Moderno e do médico e comendador João Rodrigues Pereira Moderno, descendentes de imigrantes no Brasil onde nasceram e se casaram, Alice Moderno nasceu em Paris, a 11 de Agosto de 1867 e faleceu a 20 de Fevereiro de 1946, em Ponta Delgada, apenas oito dias após Maria Evelina de Sousa, sua companheira de 40 anos. 

Embora tenha nascido em Paris, cidade onde os pais se tinham instalado, o "casal Moderno mudou para a Terceira, ainda no ano do seu nascimento, ali permanecendo durante nove meses. Regressaram a Paris, e só em 1876 vemos de novo Alice Moderno em Angra do Heroísmo e, depois, em Ponta Delgada, onde se fixou a 31 de Agosto de 1883, ano da estreia literária com a publicação da poesia “Morreu”, a que se seguiu, três anos passados, Aspirações, o seu primeiro livro de versos. [Cristina l. Duarte].

Foi a primeira aluna a frequentar o Liceu Nacional de Ponta Delgada, onde se matriculou quando já tinha 20 anos, e cursou o magistério, sendo “muito estimada pelas suas faculdades e processo de ensino” [Inocêncio Francisco da Silva e Brito Aranha, Dicionário Bibliográfico Português, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, Vol. XXII, p. 64]. 

Dirigiu o periódico mensal Recreio das Salas [1888] e o Diário dos Açores, fundou, em Ponta Delgada, o jornal A Folha [05/10/1902 - 15/04/1917], que veiculou as novas ideias feministas, divulgando o que se passava em Portugal e no Mundo, e manteve permuta com a imprensa do continente. 

Mulher combativa e emancipada, que vivia de forma independente devido exclusivamente aos seus trabalhos, tornou-se numa prestigiada activista, nos Açores, das organizações de mulheres da I República.

Militou na Liga Republicana das Mulheres Portuguesas, na Associação de Propaganda Feminista e na Associação Feminina de Propaganda Democrática

Já em 1906, o “Jornal da Mulher” de O Mundo a considerava como “uma das convictas e sinceras feministas da nossa terra” e, “apesar de estar longe de nós, [...], em todas as cruzadas de propaganda feminista que se empreendam no nosso meio, o estímulo da sr.ª D. Alice Moderno vem sempre, generosamente, animar-nos nas campanhas, as mais difíceis”. 

Colaborou em A Madrugada, órgão da LRMP, na Alma Feminina, periódico do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, e na Revista Pedagógica, dirigida pela professora, e amiga inseparável, Maria Evelina de Sousa. 

Interveio, em 1909, na campanha a favor da aprovação da Lei do Divórcio, quer através de artigos, como subscrevendo o abaixo-assinado posto a circular nesse sentido e, em Agosto de 1912, durante uma das suas frequentes passagens por Lisboa, foi homenageada, juntamente com Evelina de Sousa, companheira de causas, pela Liga. 

Para além das homenageadas, discursaram Agostinho Fortes, Carneiro de Moura, Ana Augusta de Castilho, Maria Veleda e Mariana da Assunção da Silva, tendo esta frisado que “a colectividade se devia orgulhar pela honra da sua presença, que era bem um caso esporádico visto que todas as intelectuais portuguesas, excepto D. Ana de Castro Osório, se têm afastado dela, num injusto retraimento”. Na sua intervenção, Alice Moderno considerou que “em cada membro [...] da Liga Republicana há um paladino glorioso do feminismo”. 

As mesmas duas açoreanas presenciaram iniciativas da Associação Feminina de Propaganda Democrática [1915-1916] – associaram-se à homenagem ao Presidente da República, Bernardino Machado, em Maio de 1916 – e voltaram a merecer atenção especial no Primeiro Congresso Feminista e de Educação, promovida pelo CNMP em 1924, enquanto propagandistas do feminismo e da educação das mulheres no Arquipélago. 

Mulher de negócios, “dirigindo todos os trabalhos da sua oficina tipográfica, uma exploração agrícola” [Revista do Bem, nº 113, 31/01/1912] e correspondente de importantes companhias e casas comerciais e bancárias estrangeiras nos Açores, não se pode ignorar a sua vasta e contínua colaboração em periódicos literários de todo o país: 

Bouquet Literário [1885], semanário literário e pedagógico do Porto; A Alvorada, revista mensal literária e científica de Vila Nova de Famalicão [1887, na homenagem a Camilo Castelo Branco no dia do seu 61.º aniversário]; A Apoteose [19/10/1887], número único comemorativo do sétimo centenário e inauguração da estátua de D. Afonso Henriques; Gazeta das Salas [30/01/1890], de Lisboa; A Festa das Crianças [18/10/1891], de Ponta Delgada; Nova Alvorada [1891-1903], revista mensal literária e científica de Vila Nova de Famalicão; Almanaque das Senhoras [1896, 1899, 1903, 1904, 1913 a 1919, 1923]; A Crónica [1900-1906], revista ilustrada e literária de Lisboa; O País [1901-1904], semanário independente, político, noticioso, crítico, literário e teatral do Porto; Revista de Lisboa [1901-1909]; Folha de Saudação [1902], número único dedicado a António Maria Eusébio, o Calafate; A Sociedade Futura [1902-1904]; Álbum Açoriano [1903], publicado em Lisboa; Jornal das Senhoras [1904-1905]; Alma Feminina [1907-1908], hebdomadário literário e noticioso publicado em Matosinhos; Revista Micaelense [1918-1921]; Os Açores [1922-1924, 1928]; O Despertar de Angeja [1924-1927], semanário independente, noticioso e literário; O Instituto, de Coimbra; Portugal Feminino; A Leitura [1932], publicação de Angra do Heroísmo; e Ínsula (anos 30), revista mensal ilustrada publicada em Ponta Delgada. 

Foi redactora e directora do Diário de Anúncios, periódico de Ponta Delgada do final do século XIX; participou na obra dedicada a Antero de Quental In memoriam, com “Tributo singelo” [1887]; colaborou na publicação A maior dor humana [1889], “coroa de saudades, oferecida a Teófilo Braga e sua esposa para a sepultura de seus filhos” [Inocêncio, vol. XVIII, p. 91]; e utilizou, segundo a recolha de Adriano da Guerra Andrade, os pseudónimos Da Janela do Levante, Dominó Preto, Ecila, Eurico, o Secular, Gavroche, Gil Diávolo, Gyp e Veritas. 

Poetisa consagrada e premiada, saudada por Camilo Castelo Branco, Teófilo Braga e João de Deus, com versos publicados em várias línguas (francês, inglês, alemão, italiano, espanhol, norueguês), traduziu Camões para francês, pertenceu ao Instituto de Coimbra, por proposta de Bernardino Machado, à Sociedade Literária Almeida Garrett, à Sociedade de Geografia de Lisboa, à instituição italiana Luigi di Camoens, e fundou a Sociedade Protectora dos Animais Micaelenses (1911) e o Sindicato Agrícola Micaelense. 

Mulher interventiva, que não se enquadrava nos cânones femininos da sua época, até porque usava o cabelo cortado e fumava [Maria da Conceição Vilhena], a faceta enquanto jornalista está por esmiuçar, bem como o papel que desempenhou na divulgação das ideias feministas nas ilhas. 

A poetisa açoriana Mariana Belmira de Andrade dedicou-lhe, no periódico O Velense, a poesia “Desencanto: A Alice Moderno” [1886]. Tinha então apenas dezanove anos. 

Tal como sublinhou a investigadora Maria da Conceição Vilhena no 40.º aniversário da sua morte, estamos perante “uma conhecida desconhecida”. 

Como refere Cristina L. Duarte, para além de Alice Moderno ter passado a usar cabelo curto desde os dezanove anos, "mais tarde seria considerada excêntrica pelo seu gosto pela camisa branca, com colarinho e gravata preta, acompanhado por chapéu masculino e bengala. Na década de 40, era vista pela manhã nas ruas daquela cidade, fumando charuto, a passear um cãozinho pela trela." [Agenda Feminista, As Mulheres e a República - 2010

Sobre o percurso e ideário enquanto professora, consultar a entrada de Carlos Enes para o Dicionário de Educadores Portugueses [Porto, ASA, 2003]. 

O Dicionário no Feminino (séculos XIX-XX) incluiu a sua biografia [Lisboa, Livros Horizonte, 2005],

Cristina L. Duarte fez um breve esboço biográfico para a Agenda Feminista As Mulheres e a República - 2010.

Adriana Mello fez a entrada para Feminae. Dicionário Contemporâneo [Lisboa, CIG, 2013].  

[João Esteves]

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