[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

[1620.] ANTÓNIO ESTEVES [I] || 1916 - 2017

[09/08/1916 - 10/02/2017]

Homem de leitura, de leituras e de muita reflexão, António Esteves, médico psiquiatra, conciliou o exercício da profissão com a intervenção cívica e política, evidenciando-se por invulgar saber médico, filosófico, histórico, literário, artístico e político. 

Discreto, avesso a qualquer exposição pública descabida e a vaidades efémeras, não se acomodou e pautou a sua longa vida por actos de cidadania e militância clandestina, ditados pela sua consciência, mesmo quando tal o fazia correr, e à família, riscos e perigos: "[...] com o rodar dos anos eu podia ter-me acomodado numa passividade compensadora, ter perdido a confiança e a esperança nos homens e - pior que tudo - a capacidade de me indignar. Isso não aconteceu" [Março de 1970].


De indesmentível coerência de carácter e de extrema firmeza, aliadas à reconhecida competência profissional na área da psiquiatria, “com justa apreciação clínica e muito apreciáveis aptidões de inteligência e de actividade” [Barahona Fernandes, Abril de 1950], começou, a partir da década de 1950 e até 1974, a observar e a apoiar clinicamente presos políticos, sendo também procurado por seus familiares e por outros antifascistas.

[Dedicatória de Arnaldo Mesquita || 26/01/2010]

Enquanto intransigente defensor da “pessoa doente” e da melhoria das condições dos presos políticos, NUNCA se deixou intimidar pela PIDE, NÃO TRANSIGINDO, em circunstância alguma, que os seus agentes estivessem presentes em qualquer acto médico para que tivesse sido solicitado, fosse em Caxias, Peniche, instituições médicas privadas ou públicas, o que levou o Director da PIDE a pressionar, em ofício escrito, o Director do Instituto de Assistência Psiquiátrica.   

Simultaneamente, não deixou de denunciar os riscos, inclusivamente de morte, em que os presos políticos incorriam em virtude das torturas e/ou de falta de assistência médica. 

[Manifesto "Ao Povo de Lisboa" || Setembro de 1971]

Em 1985, o médico e o Amigo Braúlio de Almeida e Sousa escreveu: “Espírito culto, dotado de vibrante inteligência e de finíssima sensibilidade; com uma firmeza e coerência de carácter que a sua figura física mal faz suspeitar; de humanismo esclarecido; materialista dialéctico militante; amigo pessoal do grupo da Vértice e dos vultos maiores do neo-realismo em Portugal […] é […] sempre discreto, quase que entocado”, embora de “impressionante poder pedagógico que só em círculos restritos e de contacto directo se manifesta”.

[Intervenção num "Colóquio sobre Psiquiatria do Sector" - 1971 || Diário de Lisboa || Documento descoberto e enviado por Júlia Coutinho, a quem muito se agradece] 

Vida plenamente vivida apenas segundo a sua consciência e com uma História riquíssima de acontecimentos únicos ainda por escrever/revelar, António Esteves completaria hoje, 9 de Agosto de 2017, 101 anos.

[João Esteves]

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