* VIRGÍNIA MOURA || ANTÓNIO LOBÃO VITAL *
[Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto || 2015]
Há vidas que ousaram resistir, resistir uma vida inteira, acarretar com as consequências, manter intacta a coerência e a dignidade, enfrentar cada dia com a mesma tenacidade e esperança, envolver os outros, aqueles que também souberam caminhar do mesmo lado e lado a lado.
Entre essas vidas estão, seguramente, Virgínia Faria de Moura (1915-1998) - presa por dezasseis vezes, nove vezes processada, três vezes condenada, inúmeras vezes agredida, espancada e torturada, tendo-lhe a PIDE, num episódio pouco conhecido e referido, queimado os peitos - e António Lobão Vital (1911-1978), o seu companheiro de sempre, ambos militantes do Partido Comunista.
E se há vidas que perduram no tempo, há também livros que as sabem dignificar, como é o caso da excelente e cuidada edição, pela Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, de Tem cuidado meu amor. Cartas de prisão de Virgínia Moura e António Lobão Vital, com organização, apresentação e notas de Manuela Espírito Santo.
O livro, comovente pelo que revela de uma vida una de luta sem descrença no futuro, é muito mais do que a publicação de 47 cartas escritas entre 12 de Dezembro de 1951 e 27 de Agosto de 1957, o que só por si seria mais do que relevante.
Por ele perpassam tempos duríssimos de uma Ditadura que parecia não ter fim, as vivências - prisionais, mas não só – de dois que são só um, os amigos, os companheiros, as causas, as lutas, tudo cuidadosamente referenciado na apresentação de Manuela Espírito Santo e nas notas que sucedem a cada epístola, sendo que António Lobão Vital escreve no endereço “Virgínia Moura, presa política em…” e no remetente “preso político em…” [p. 26].
Não é só Virgínia Moura, nascida há cem anos quando da edição do livro, e Lobão Vital que se reencontram aqui. É toda uma época que é desnudada, tendo por companheiros de viagem, alguns, felizmente, vivos, Albertino Macedo, Alcino Soutinho, Álvaro Cunhal, António Macedo, António Ramos de Almeida, Armando Bacelar, Arménio Losa, Artur Santos Silva (pai), Avelino Cunhal, Celeste Fernandes, César Príncipe (a quem Virgínia doou este acervo), Conceição Bacelar, Damião Marques Moura (tio), Eugenie Cotton, Frédéric Juliot Curie, Georgina Azevedo, Guilherme da Costa Carvalho, Heliodoro Caldeira, Herculana de Carvalho, Humberto Delgado, Ilse Losa, Joaquim Loza, Joaquim Ribeiro, José Morgado, José Rodrigues, José Vital de Matos (pai de Lobão Vital), Lino Lima, Manuel de Azevedo, Manuela Juncal, Maria da Conceição Marques Moura (prima de Virgínia e a primeira mulher a licenciar-se em engenharia pela FEUP), Maria de Faria Moura (tia), Maria Helena Novais, Maria José Ribeiro, Maria Margarida (esposa de Ruy Luís Gomes), Mário Cal Brandão, Norton de Matos, Orlando Juncal, Óscar Lopes, Osvaldo Santos Silva, Papiniano Carlos, Rocha Martins, Rosa Moura (mãe de Virgínia), Ruy Luís Gomes, Rui Ramos Loza, Salomé Vasconcelos, Teixeira de Pascoais, e muitas e muitos mais…
Sinal dos tempos, não valerá a pena procurá-lo na maioria das livrarias… mas sim encomendá-lo diretamente à Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto.
[João Esteves]
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