* LUÍS NEVES REAL *
[1910-1985]
Quanto mais se penetra na estrutura da Associação Feminina Portuguesa para a Paz, ou na do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, mais sobressai o carácter político enquanto grupos de mulheres oposicionistas à Ditadura do Estado Novo, indo muito para além da tentativa de aglutinar mulheres em torno da reivindicação de direitos.
Se se destacam muitos nomes de mulheres, sendo numerosas as que se encontram por estudar e por reconstituir percursos, militâncias e sociabilidades, também sobressaem nomes de homens, nomeadamente no Porto, que procuraram contribuir com a sua solidariedade e ativismo para a sobrevivência da Associação Feminina Portuguesa para a Paz.
Já se referiu o nome de Mário Sacramento. Segue-se agora o de Luís Neves Real, sendo que, apesar da sua relevância enquanto matemático ou enquanto cineclubista destacado, não foi ainda possível associar-lhe um rosto.
Professor universitário, matemático, engenheiro, cinéfilo e cineclubista.
Licenciado em Ciências Matemáticas (1932), com 18 valores, e em Engenharia Electrotécnica (1937) pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Luís Neves Real foi um dos muitos intelectuais que integraram, enquanto sócios auxiliares, a Delegação local da Associação Feminina Portuguesa para a Paz [Lúcia Serralheiro, Mulheres em Grupo Contra a Corrente, Rio Tinto, Evolua Edições, 2011].
Oposicionista desde o final da década de 1920 à Ditadura, quando era estudante universitário e envolveu-se na greve académica de 1928 contra a supressão das três escolas superiores do país (Letras do Porto, Direito em Lisboa e Farmácia em Coimbra), foi dos primeiros professores universitários a ver rescindido o seu contrato, o que sucedeu em maio de 1934, quando era Assistente da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, por ter assinado um “protesto” dirigido ao Reitor e aos Diretores daquela instituição contra o tipo de ensino ministrado e a falta de liberdade.
Com ele, foram afastados os também Assistentes António Barros Machado [1912-2002] e Henrique Vítor Ziller Perez.
Data desse tempo o contacto com Ruy Luís Gomes [1905-1984], de quem será, durante décadas, amigo, colaborador e companheiro de ideário político, estando ambos associados ao impulso dado ao movimento matemático naquela cidade através do Centro de Estudos Matemáticos – fundado em 18 de fevereiro de 1942, onde também pontificavam Almeida Costa, Manuel Barros, Manuel Miranda, Alfredo Pereira Gomes –, da Sociedade Portuguesa de Matemática e do Seminário de Matemática, que chegou a funcionar em casa de Luís Neves Real.
Embora novamente contratado, em 1942, como 2.º Assistente além do quadro da FCUP, rescindiu o contrato em 1945, passando a dedicar-se exclusivamente ao Centro de Estudos Matemáticos, onde permaneceu até Ruy Luís Gomes ser demitido em maio de 1947 [Fernando Rosas e Cristina Sizifredo, Estado Novo e Universidade: a perseguição aos professores, Lisboa, Tinta-da-China, 2013].
Deu explicações de matemática e, sócio da empresa Neves e Pascaud, proprietária dos cinemas Batalha, Olímpia e Trindade, tornou-se, naquele ano, associado do Cineclube do Porto (CCP), tal como Manuel de Azevedo, outro nome ligado à Delegação do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz, deixando profundas marcas enquanto cineclubista, programador e crítico.
Segundo Lúcia Serralheiro, a AFPP organizou em janeiro de 1952 um concerto com Fernando Lopes Graça no Cinema Batalha, onde também participou Maria da Graça Amado da Cunha, pianista e sócia da AFPP de Lisboa, a cuja direção pertenceu entre 1944 e 1948.
Nesse mesmo ano, em maio, Luís Neves Real consta entre as testemunhas de defesa de Virgínia Moura que, mais uma vez, fora detida, aguardando em Caxias o julgamento [Manuela Espírito Santo, Tem cuidado meu amor. Cartas da prisão de Virgínia Moura e António Lobão Vital, Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, 2015].
Em setembro de 1952, aquando da homenagem a António Luís Gomes, pai de Ruy Luís Gomes, Luís Neves Real escreveu para o jornal República o texto «Uma lição dos homens da “Propaganda”» e que o Blogue Bernardino Machado, do Dr. Manuel Sá Marques, deu relevo.
[Com a devida vénia, reproduz-se aqui o esclarecedor apontamento de Fernando Ribeiro, retirado do seu blogue A Matéria do Tempo: Baixo-relevo de Américo Soares Braga (1909-1991) na fachada do Cinema Batalha, Porto. A figura feminina que se encontra de pé em baixo, à esquerda, representa uma ceifeira empunhando uma foice; à sua direita, com uma corrente ao ombro, está representado um operário, que tinha na sua mão um martelo. Antes da inauguração do cinema em 1947, o martelo teve que ser retirado, porque a representação de uma camponesa e de um operário, com uma foice e um martelo nas mãos, fazia com que este baixo-relevo fosse "subversivo"...]
Nesse mesmo ano, em maio, Luís Neves Real consta entre as testemunhas de defesa de Virgínia Moura que, mais uma vez, fora detida, aguardando em Caxias o julgamento [Manuela Espírito Santo, Tem cuidado meu amor. Cartas da prisão de Virgínia Moura e António Lobão Vital, Associação dos Jornalistas e Homens de Letras do Porto, 2015].
Em setembro de 1952, aquando da homenagem a António Luís Gomes, pai de Ruy Luís Gomes, Luís Neves Real escreveu para o jornal República o texto «Uma lição dos homens da “Propaganda”» e que o Blogue Bernardino Machado, do Dr. Manuel Sá Marques, deu relevo.
Um ano depois, em 1 de abril de 1953, publicou no Diário de Lisboa o texto "A obra de investigação no domínio das Matemáticas empreendida pelo prof. Rui Luís Gomes".
[Diário de Lisboa || 1 de Abril de 1953, p. 7]
A colaboração com Ruy Luís Gomes manteve-se e, em 1955, apresentaram no [Primeiro] Congresso Nacional de Filosofia, realizado em Braga, a comunicação “De Poincaré ao Intuicionismo Atual na Crítica dos Fundamentos da Matemática; Reflexos no Pensamento Filosófico e Matemático Português, texto de onde se dá destaque ao pensamento de Sampaio Bruno.
No dia do jubileu de Ruy Luís Gomes, em 5 de dezembro de 1975, coube a Luís Neves Real, enquanto antigo aluno, o primeiro dos seus assistentes e companheiro de lutas, a autoria do importante discurso evocativo.
Um ano depois da morte do Mestre, em 1985, o texto “Testemunho de Luís Neves Real”, complementado com a atividade posterior a 1975, foi editado no Boletim da Sociedade Portuguesa de Matemática, n.º 8 [setembro de 1985].
Em 1986, na sequência do seu desaparecimento, a Faculdade de Ciências da Universidade do Porto criou o Prémio Dr. Neves Real, atribuído anualmente ao aluno que completar a Licenciatura em Matemática Pura com média mais elevada, não inferior a 17 valores.
O seu impressionante Curriculum Vitae foi publicado no Boletim da Sociedade Portuguesa de Matemática de Dezembro de 1988 [n.º 11], dele se destacando os prémios recebidos nos anos letivos de 1928-1929 [Prémio Gomes Teixeira] e de 1930-1931 [Prémio Gomes da Silva]; os convites, ainda enquanto aluno, para Assistente dos 1.º e 2.º Grupos de Matemática; as instituições em que colaborou; as seis propostas, entre 1937 e 1946, para bolseiro, todas recusadas; e os trabalhos da sua autoria.
O seu impressionante Curriculum Vitae foi publicado no Boletim da Sociedade Portuguesa de Matemática de Dezembro de 1988 [n.º 11], dele se destacando os prémios recebidos nos anos letivos de 1928-1929 [Prémio Gomes Teixeira] e de 1930-1931 [Prémio Gomes da Silva]; os convites, ainda enquanto aluno, para Assistente dos 1.º e 2.º Grupos de Matemática; as instituições em que colaborou; as seis propostas, entre 1937 e 1946, para bolseiro, todas recusadas; e os trabalhos da sua autoria.
[João Esteves]
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