[Cipriano Dourado]

[Cipriano Dourado]
[Plantadora de Arroz, 1954] [Cipriano Dourado (1921-1981)]

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

[2681.] PRESOS POR MOTIVOS POLÍTICOS: DA DITADURA MILITAR AO INÍCIO DO ESTADO NOVO [CXLI] || 1926 - 1933

 * PRESOS POR MOTIVOS POLÍTICOS: DA DITADURA MILITAR AO INÍCIO DO ESTADO NOVO || CXLI *

01035. Carlos Luís Correia Matoso [1931, 1932, 1932, 1938

[Carlos Luís Correia Matoso || F. 12/09/1931 || ANTT || PT-TT-PVDE-Policias-Anteriores-3-NT-8903 || "Fotografia cedida pelo ANTT"]

[Vila do Bispo, 15/07/1908, estudante - Lisboa. Filiação: Elisa Correia Dias Matoso, José Matoso. Solteiro. Residência: Rua Francisco Tomás da Costa, 49 / Rua Passos Manuel, 101 - Lisboa.


[Elisa Matoso e José Matoso || Fotografias enviadas por Rodney de Castro Rodrigues, casado com a neta de Carlos Matoso, em 14 de julho de 2018]

Carlos Matoso foi um relevante militante do Partido Comunista na década de 30, tendo sido deportado para o Campo de Concentração do Tarrafal em 1939, onde foi vítima de inenarrável violência e assistiu ao falecimento do seu camarada Bento GonçalvesRegressou em 10/01/1946, “acabrunhado, tristonho, perdida a sua magnífica exuberância antiga" [Armindo Rodrigues], e exilou-se no Brasil, onde constituiu família e se suicidou em 03/03/1959. 

[Carlos Matoso aos 4 e 7 anos de idade || Fotografias da Família, cedidas por Rodney de Castro Rodrigues]

Estudante de Agronomia, aderiu à Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas, onde foi um importante quadro, juntamente com Carolina Loff da Fonseca, Edmundo Pedro, Francisco Paula de Oliveira (Pável), Fernando Quirino, Francisco Ferreira, Gilberto Florindo de Oliveira, Grácio Ribeiro, Manuel Rodrigues de Oliveira, Pedro Baptista da Rocha e Victor Hugo Velez GriloDesempenhou, durante a década de 1930, actividade muito relevante no seio do Partido Comunista Português, tendo trabalhado, entre outros, com Bento Gonçalves, seu Secretário-Geral. Preso em 1931, pois há uma fotografia no Livro de Cadastrados com a data de 12/09/1931. No ano seguinte, fez parte do grupo que preparava ações no 1.º de Maio, com recurso a engenhos explosivos.

[Carlos Matoso || Agosto de 1932 || Fotografia da Família cedida por Rodney de Castro Rodrigues]

Terá sido preso em 24/04/1932, quando experimentavam bombas na Serra de Monsanto, juntamente com Abel Augusto Gomes de Abreu (gráfico da Casa da Moeda), António Franco Trindade, Álvaro Augusto Ferreira, Eduardo Valente Neto (marítimo), João Lopes Dinis (canteiro, faleceu no Tarrafal em 12/12/1941), Manuel Francisco da Silva (pedreiro) e Silvino Fernandes Costa (ajudante de farmácia). Foi-lhe fixada residência obrigatória em Peniche, para onde seguiu da Penitenciária de Lisboa em 18 ou 19/08/1932, e de onde terá fugido. Preso em 09/12/1932, recolheu, incomunicável, a uma esquadra; libertado em 17/12/1932. Em 1933 ou 1934, nasceu-lhe a filha Helena, fruto da sua relação com Carolina Loff. Esta e a filha recém-nascida partiram para a União Soviética, onde chegaram em Abril de 1935, tendo Helena sido recolhida na escola internacional de Ivanovo. Julgado à revelia pelo Tribunal Militar Especial em 20/10/1934, foi condenado a dez anos de prisão no degredo e multa de vinte mil escudos, ficando, depois, à disposição do Governo. Depois de andar anos na clandestinidade e procurado, foi preso pela Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE) em 11/05/1938, aquando do assalto noturno a uma tipografia clandestina, no Rego (Processo 562/938, enviado ao TME em 01/09/1938). Levado para uma esquadra, incomunicável, entrou no Aljube em 3 de Agosto, foi transferido, no dia 10, para uma esquadra, regressou ao Aljube em 23 e enviado para Caxias em 26 do mesmo mês. Transferido para a 1ª Esquadra em 27/09/1938, seguiu, dois dias depois, para o Reduto Norte de Caxias e enviado para Peniche em 1 de Novembro. Voltou ao Aljube em 22/03/1939. A mãe procurou, sempre que possível, visitá-lo, o que se tornava muito difícil com a mudança constante de prisão. Julgado pelo Tribunal Militar Especial em 10/05/1939, viu a pena de 20/10/1934 ser agravada para doze anos e perda dos direitos políticos por cinco anos. Integrou, em 20/06/1939, a 6.ª leva de presos políticos enviada para o Campo de Concentração do Tarrafal, juntamente com Alberto Araújo e Augusto Valdez, de onde só foi libertado em 20/12/1945. No Tarrafal, foi, como muitos outros presos, vítima de inenarrável violência, tendo assistido ao falecimento de Bento Gonçalves, que há muito conhecia e com quem militara no Partido Comunista: “Carlos Matoso ao notar aquela imobilidade, aquela qualquer coisa que logo nos fazia distinguir a vida da morte; pegou num pequeno espelho e aproximou-o à boca de Bento Gonçalves. Já não havia sopro de vida, e Carlos Matoso não pode conter toda a sua mágoa e toda a sua revolta. // - Assassinos! // O capitão Olegário fitou-o demoradamente e não tardou que o chamasse à secretaria para o esbofetear” (Tarrafal – Testemunhos, 1978). No Campo de Concentração, integrou o núcleo dirigente Organização Comunista Prisional do Tarrafal, juntamente com outros membros do Comité Central, alguns dos quais haviam pertencido ao seu Secretariado, como Alberto Araújo, Francisco Miguel, Júlio Fogaça, Manuel Alpedrinha, Miguel Wager Russell e Militão RibeiroRegressou em 10 de Janeiro de 1946: “Vinha acabrunhado, tristonho, perdida a sua magnífica exuberância antiga”. No livro Um poeta recorda-se – Memórias de uma vida, o médico e poeta Armindo Rodrigues, amigo de convívio diário de Carlos Matoso durante a década de 30, tece-lhe os maiores elogios políticos, partidários e humanos: Do Carlos Matoso nunca me adveio o menor perigo. Pelo contrário, quando o prenderam pela última vez, no assalto nocturno a uma tipografia clandestina, no Rego […] não disse uma palavra que pudesse comprometer-me” [p. 16]; “[…] homem honrado e inflexível” [p. 150]; Dos regressados da deportação, um era o meu amigo Carlos Matoso, a quem devo a mudez leal que a meu respeito manteve. Vinha acabrunhado, tristonho, perdida a sua magnífica exuberância antiga. E a breve trecho, por diligência do irmão rico, oficial da Aviação Marítima e genro único do banqueiro Soto Maior, emigraria para o Brasil” (pp. 223-224).


[Carlos Luís Correia Matoso || 1946 || Documento referente à emigração, em 1946, para o Brasil, enviado pelo Historiador Brasileiro Paulo Valadares]

Exilado, desembarcou no Rio de Janeiro em 14/05/1946, passando a trabalhar como caixeiro viajante, comercializando produtos da empresa do irmão, o Comandante José Francisco, casado com a única herdeira do banco Pinto Souto Maior, por todo o Brasil.

[Carteira de trabalho do comércio do Rio de Janeiro || 1954 || Cedidas por Rodney de Castro Rodrigues]

Reconstruiu a sua vida e formou família: casou com Raimunda Mirtes Soares, que conhecera quando trabalhava em Fortaleza, e do enlace nasceu Maria Tereza Soares Matoso Sampaio

[Carlos Luís Correia Matoso e Raimunda Mirtes || Maio de 1949 || Fotografia da Família, cedida por Rodney de Castro Rodrigues]

Residiu, ainda, em Salvador da Baía e em São Paulo, antes de se fixar no Rio de Janeiro, trabalhando sempre para o irmão. Apesar das diligências feitas, nunca reencontrou a filha Helena e as duas irmãs, talvez com cerca de quinze anos de diferença, também nunca se viram. 

[Carlos MatosoRaimunda Mirtes e a filha Maria Tereza || Fotografia cedida por Rodney de Castro Rodrigues]

Visitou Portugal com a mulher e a filha, tendo sido, temporariamente, detido quando desembarcou.

[Carlos Matoso || Fotografia do Passaporte] 

[Momento em que foi festejada sua chegada a Portugal ao lado de sua mãe e esposa, horas após ser solto de uma prisão logo que desembarcou || Fotografias cedidas por Rodney de Castro Rodrigues]

No dia 3 de março de 1959, quando a filha tinha apenas sete anos, Carlos Matoso saiu de casa para um dia comum de trabalho, acabando por suicidar-se no Hotel Quitandinha, em Petrópolis e em cujo cemitério foi enterrado. 

[Maria Tereza ao lado de sua mãe Raimunda Mirtes em visita ao túmulo de seu pai, em Petrópolis || Fotografia cedida por Rodney de Castro Rodrigues]

Nota: As informações referentes à vida de Carlos Matoso no Brasil devem-se a Maria Tereza Matoso Sampaio, sua filha, à neta Rafaela Matoso e a Rodney de Castro Rodrigues, marido de Rafaela, a quem se agradece a confiança de poder disponibilizar esta documentação.]
[alterado em 07/04/1932]

[João Esteves]

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